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Editorial

Novo marco é esperança para saneamento básico

Nada menos que 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada e cerca de 100 milhões não têm serviço de coleta de esgoto

16/04/2020 06h24

Um dos problemas mais graves de saúde pública no Brasil é, desde sempre, a baixa qualidade do saneamento básico, o que quer dizer, além das graves deficiências na rede de esgotamento sanitário, uma enorme dificuldade de acesso à água tratada. Afinal, está mais do que comprovado que inúmeras doenças que acometem nossa população, especialmente a parte que está nos últimos vagões deste comboio chamado Brasil, decorrem das más condições fitossanitárias.

Discussão que se arrasta há muito tempo, parece que no bojo desta pandemia do novo coronavírus, o Congresso Nacional finalmente está se mobilizando para aprovar o novo marco regulatório do saneamento básico. Com o agravamento da crise provocada pela pandemia da Covid-19, a matéria foi listada pela equipe econômica do governo entre as que devem ter a tramitação acelerada e está sendo considerada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, como pauta prioritária da Casa para 2020. O projeto já foi analisado pela Câmara e está quase pronto para ir a Plenário virtual para votação remota pelos senadores.

Nenhum país do mundo pode ambicionar chegar a ser considerado desenvolvido se não cuidar, com vigor e intensidade, dessa questão. Para mostrar como estamos atrás nesta corrida, basta verificar que, segundo dados do Sistema Nacional de Informação sobre o Saneamento (SNIS), nada menos que 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada e, pasmem, cerca de 100 milhões (quase a metade da população) não têm serviço de coleta de esgoto.

A pandemia do novo coronavírus expôs, com brutalidade, os danos que tais carências provocam, uma vez que as medidas mínimas de prevenção recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como lavar as mãos com água e sabão, tornam-se impossíveis de serem adotadas por boa parte da população do Brasil. O relator do projeto, que encontra-se tramitando na Comissão de Meio Ambiente do Senado, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), está otimista e já disse que fez apenas ajustes de redação para garantir que as novas regras não prejudiquem as cidades menos desenvolvidas e os cidadãos com mais dificuldades de acesso ao tratamento sanitário.

O parlamentar defende que o projeto ganhe realmente prioridade, observando que a proposta não é relevante apenas para o aspecto sanitário, mas também porque tem potencial para alavancar investimentos em um momento que a cambaleante economia nacional tanto precisa, especialmente pela necessidade de retomada da geração de empregos. Pela proposta em tramitação, a regulação do saneamento básico ficará a cargo da Agência Nacional de Águas (ANA) e exige dos municípios e dos blocos de municípios que implementem planos de saneamento básico. Estão previstos até apoio técnico e ajuda financeira para essa tarefa.

Como tudo que tramita no Congresso Nacional, ainda é esperada muita discussão em torno do tema, até que ele seja aprovado, apesar do aparente interesse de quase todos para que o novo marco regulatório do saneamento básico passe a vigorar. Uma das questões que podem gerar impasse é justamente o modelo proposto, que permite abrir mais caminho para o envolvimento de empresas privadas no setor, uma vez que parlamentares da oposição alegam que a exigência de licitações e as metas de desempenho para contratos tenderão a prejudicar e alienar as empresas públicas.

De uma coisa nós, brasileiros da planície, sabemos: não dá mais para convivermos com essa tragédia cotidiana que é ter milhões de pessoas sem acesso à água potável e sem esgotamento sanitário em suas residências. A sobrecarga que tal quadro provoca na rede de saúde pública é imensa e vem de muito antes da pandemia da Covid-19. São milhões de pessoas que morrem, ano após ano, por doenças facilmente evitáveis com condições fitossanitárias de melhor qualidade.

Esperemos que os congressistas brasileiros superem rapidamente os impasses e que o Brasil possa, enfim, proporcionar à sua população mais pobre melhor qualidade de vida. E que não seja preciso a tragédia de uma pandemia para abrir a cabeça dos parlamentares e das autoridades de todas as instâncias para a urgência da correção dessa grave injustiça social.