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Artigo

A segurança do trabalho no Brasil em tempos de pandemia

Ludmilla Sercundes e Mauricio Prieto

28/11/2020 11h30

Foto: Divulgação

O ordenamento jurídico brasileiro tem um sistema importante de proteção à saúde e à vida do trabalhador, representando um direito fundamental assegurado em nosso texto constitucional.

Neste sentido, o fundamento para a saúde e a segurança do trabalhador está estabelecido na Constituição Federal, conforme disposto no art. 1º, incisos III e IV, que trata da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho.

Igualmente, encontram-se no art. 7º da Carta Maior, normas que protegem o empregado, como aquela prevista no inciso XXII, que estabelece como direito essencial a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), dedica todo o Capítulo V à segurança e medicina do trabalho, contendo disposições legais que devem ser observadas e cumpridas por todos os empregadores.

A segurança no trabalho envolve todos os aspectos relacionados à saúde dentro do ambiente laboral. Doenças ocupacionais, violência, assédio moral e sexual, acidentes de trabalho e assuntos relacionados fazem parte dos temas que são observados.

A situação de pandemia

A sociedade atravessa uma situação econômica e sanitária sem precedentes, provocada pela pandemia do Coronavírus, impactando todos os setores da economia.

A crise instaurada pela pandemia afetou a saúde física e emocional do trabalhador de diversas formas, na medida em que a maneira de exercer a atividade laboral foi modificada.

Neste contexto, surgem diferentes realidades no ambiente de trabalho, com pessoas exercendo suas atividades em home office e outros prestando presencialmente, sejam atividades privadas ou serviços públicos essenciais à população. Em ambos os casos, a saúde e a segurança laboral passaram a ganhar ainda mais importância com as ações de prevenção ao contágio pelo novo Coronavírus.

Mais que nunca, é imprescindível adotar e seguir rigorosamente as normas de segurança no trabalho previstas para o momento atual.

Diversas medidas são necessárias para promover o achatamento da curva de contágio, de modo que todos os doentes tenham a oportunidade de receber os devidos cuidados médicos.

O governo federal tem apresentado um conjunto de medidas urgentes e necessárias à prevenção, controle e mitigação dos riscos. Como evento ímpar que é, demandará esforço conjunto de todos para minimização dos impactos sociais e econômicos, até que o estado de calamidade se encerre. 

A este propósito, foi criado um protocolo para a prevenção da COVID-19, emitido pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, Secretaria de Trabalho e Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério da Economia.

A orientação é no sentido de que trabalhadores e empregadores observem as medidas que se seguem como forma de prevenir e/ou diminuir o contágio da Covid-19 e manter os empregos e a atividade econômica, certos de que superaremos as dificuldades que se apresentam.

Programa Trabalho Seguro

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) criou o Programa Trabalho Seguro, definindo como tema de atuação no biênio 2020-2022 a “Construção do trabalho seguro e decente em tempos de crise: prevenção de acidentes e de doenças ocupacionais”.

Segundo o TST, a pandemia reforça a importância da saúde e da segurança no trabalho que são alguns dos focos de atuação da Justiça do Trabalho, especialmente por meio do Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho - “Trabalho Seguro”. 

Faz-se mister, neste momento, o uso dos equipamentos de proteção individual – EPI’s, previstos em Lei Ordinária, consoante o artigo 166, da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, a saber:

“Art. 166 – A empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamento de proteção individual adequado ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes e danos à saúde dos empregados”.

Os gestores nacionais do Programa Trabalho Seguro recomendam o esforço das corporações e empresas, a fim de adotarem de imediato medidas protetivas à segurança e saúde do trabalhador, durante e após a pandemia.

O desembargador Sebastião de Oliveira, do TRT da 3ª Região (MG), gestor nacional do Programa na Região Sudeste, afirma que o contexto atual requer esforços de todos para evitar o adoecimento profissional. “É necessário que as corporações e as empresas se reúnam e montem uma equipe de emergência para tratar de quatro passos – prevenção, diagnóstico, tratamento e retorno ao trabalho. É preciso uma conjugação de esforços de patrão e empregado para salvar todos que puder”, ressalta.

Destaca o gestor nacional do Programa na região Nordeste, Juiz André Machado Cavalcanti, que muitos trabalhadores foram obrigados a trabalhar em home office, muitas vezes sem condições para tanto.

Outros, estão trabalhando em situações de extremo risco; e uma grande parcela está privada do trabalho, seja porque foram dispensados, seja porque são profissionais liberais ou empreendedores e tiveram que fechar seus negócios em razão da calamidade pública. “Tudo isso causou uma situação de extremo estresse, forte tensão e muito abalo emocional”, assinala.

O Juiz do Trabalho Leonardo Vieira Wandelli, da 9ª Região (PR), representante da Região Sul no Programa também reforça a seriedade das medidas de prevenção: “O cumprimento das orientações e das normas, como distanciamento, uso de máscara, luvas, restrições no transporte de empregados, os cuidados no refeitório, tudo deve ser exigido pelas empresas, pelos empregados e pelo poder público, porque interessa a todos. E esse cuidado precisa ser estendido ao teletrabalho e ao trabalho externo, tanto de empregados quanto de autônomos, o que é um grande desafio”.

A preocupação vai além do momento atual, pois considera também as consequências e os riscos psicossociais do trabalho pós-pandemia.

A desembargadora Márcia Bessa, do TRT da 11ª Região (AM/RR), gestora nacional representante da Região Norte, afirma: “É certo que o teletrabalho e a interação virtual, envolvendo a comunicação não presencial intermediada por e-mails, telefone, videoconferências e aplicativos como WhatsApp, serão integradas ao cotidiano de muitas empresas definitivamente”.

“E aí surgem doenças novas, ou não tão novas assim, como o tecnoestresse e a infoxicação. Como identificá-las e preveni-las? Um dos desafios do futuro será lidar com os males advindos do uso excessivo da tecnologia. Surgirão muitos debates, especialmente em relação ao controle da jornada de trabalho”.

Perspectivas

Se por um lado houve uma curva de aprendizado no que se refere às medidas de precaução e tratamento da Covid-19, por outro, as relações de trabalho mesmo que alteradas em sua dinâmica, permanecem submetidas às mesmas normas legais, por ora flexibilizadas.

É inegável que as mudanças na forma de vida e de trabalho têm agravado doenças físicas e psíquicas, em razão dos desafios e das consequências dessa nova realidade, afetando, especialmente, a população mais vulnerável.

Ao tempo em que este artigo é escrito, a impressão geral é que, no Brasil, a pandemia já passou por seu momento mais impactante. No entanto, tendo em vista indicadores que vêm do exterior, é possível que ainda experimentemos o que se convencionou chamar de “segunda onda” da doença.

Dessa maneira, a observância da legislação e das normas de segurança no trabalho é de extrema importância, a fim de prevenir e reduzir as doenças e acidentes do trabalho, pelo impacto econômico e humanitário que acarretam, visando principalmente a preservação da saúde e integridade da nossa sociedade.

De resto, todos aguardamos o advento de uma vacina que, de antemão se sabe, não será de aplicação ampla nem tampouco de efeito imediato.

Ludmilla Sercundes e Mauricio Prieto são sócios diretores da Synerhgon, empresa de consultoria multidisciplinar com foco no resultado. [email protected]