Utilizamos cookies de terceiros para fins analíticos e para lhe mostrar publicidade personalizada com base num perfil elaborado a partir dos seus hábitos de navegação. Pode obter mais informação e configurar suas preferências AQUI.

Transporte Aéreo

Argentina Flybondi planeja voar mais pelo Brasil

A empresa sobreviveu à pandemia com batalha por preços baixos em meio aos altos custos da região

10/04/2023 08h46

Foto: Divulgação 

Ser um negócio nascente já é um desafio. Ser um negócio nascendo, no momento em que uma pandemia sem precedentes atinge a economia global, deixa o desafio bem mais difícil.

Mas ser um negócio nascente, no meio de uma pandemia e no setor de aviação – um dos mais atingido pela quase total paralisia do mundo causada pelo coronavírus em 2020 – torna a tarefa de sobreviver praticamente impossível.

Era essa a situação da argentina Flybondi. A companhia aérea de baixo custo tinha acabado de completar seu segundo ano de vida quando a Argentina, ao lado de uma infinidade de outros países, fechou completamente a circulação em março de 2020.

“Não existia no mundo nenhuma indústria que pudesse ter um plano para sobreviver pelos nove meses que durou o lockdown na Argentina. Deixamos de voar em 22 de março de 2020 e só voltamos em 12 de dezembro”, contou o presidente da Flybondi, Mauricio Sana.

Foto: Divulgação 

Com voos que, por valores a partir de R$ 1.000 a ida e a volta, ligam Buenos Aires a três cidades brasileiras – Rio de Janeiro, São Paulo e Florianópolis -, a Flybondi tem no Brasil seu segundo maior mercado fora da Argentina. E quer seguir expandindo. Paraguai e Uruguai são outros destinos que a empresa atende além das rotas domésticas.

Novos voos no Brasil e mala obrigatória

“No Brasil, temos uma lista de ao menos seis cidades que estamos analisando”, diz Sana sobre os planos de novos voos.

Belo Horizonte e Porto Alegre, além de rotas diretas daqui para Bariloche, são alguns dos projetos planejados pela Flybondi, se tudo der certo, ainda até o fim deste ano. Atualmente, todas as linhas do Brasil vão para Buenos Aires.

A expansão, porém, depende de uma coisa: o Brasil não tornar obrigatório o despacho gratuito de bagagem de novo. Isto, afirma Sana, necessariamente puxa seus preços para cima.

“Se o Congresso aprovar a obrigatoriedade, passará a haver um excesso na minha tarifa além do que eu tinha planejado. Muda a nossa análise”, diz.

Hoje, a Flybondi opera diariamente três voos para o Rio, de dois a três para Florianópolis e um para São Paulo.

Modelo “a la carte”

A lógica, explica o CEO da Flybondi, é que, a partir do momento em que o despacho de uma mala de até 23 quilos se torna obrigatório, as companhias aéreas passam a ter que embuti-lo no preço da passagem. “Pesa e gasta mais combustível”, diz.

A exigência atinge diretamente o modelo definido como “a la carte” por ele e que está na essência das companhias de baixo custo, também conhecidas como low cost: cobrar por tudo que for possível a parte.

Na Flybondi, como em outras low costs do mundo, a tarifa base inclui essencialmente o embarque e a mala de mão. Bagagem, escolha dos assentos e a possibilidade de passar pelo check-in sem fila são opcionais cobrados por fora.

Os lanches também não estão inclusos e são vendidos a bordo.

“Quem vier a Buenos Aires só para um fim de semana provavelmente precisará de uma mochila de seis quilos e a passagem, nada mais”, diz Sana.

“No nosso avião, você compra uma água se quiser, se não quer água, compra um café. Não cobro na passagem um serviço de bordo que te obriga a tomar o café com o bolinho que tem. Se você não gosta de bolinho, vai pagar do mesmo jeito.”

Combustível pelo dobro do preço

Fazer mais voos com os mesmos aviões e lutar por manter a ocupação sempre alta são outras estratégias comuns que fazem fechar a conta de uma low cost.

Para a Flybondi, foi também o que ajudou a sobreviver a outro problema da pandemia sem precisar subir demais o valor das tarifas: a explosão dos preços dos combustíveis no mundo.

Eles são o principal custo de qualquer companhia aérea – cerca de 30% a 40% para a Flybondi – e mais que dobraram de preço a partir de 2021.

De acordo com Sana, a Flybondi passou pela pressão de custo fazendo “alguns aumentos não tão exagerados” em suas tarifas, o que permitiu “pagar os custos e ainda manter [a empresa] nesse segmento” das companhias aéreas baratas.

“O combustível ou o arrendamento dos aviões não são mais baratos para mim porque eu sou uma low cost, então eu tenho que ser eficiente. Em vez de voar com 100 passageiros, queremos voar com 180. Um avião nosso voa de seis a sete vezes por dia, enquanto o de uma companhia tradicional provavelmente voa quatro, e está tudo bem.”

Longe do padrão europeu

Mesmo com todos os esforços, ainda é difícil achar, dentro ou fora da Flybondi, no Brasil ou na Argentina, voos tão baratos quanto os vendidos pelas companhias aéreas de baixo custo da Europa, região onde o modelo se consagrou com empresas como a irlandesa Ryanair, a britânica EasyJet ou a espanhola Vueling.

Enquanto as viagens da Flybondi, e também das concorrentes na região, partem de pelo menos R$ 1.000 para as rotas de duas a três horas que fazem entre Buenos Aires e as cidades brasileiras, na Europa é possível achar passagens para distâncias semelhantes a partir dos R$ 270, ida e volta.

É o caso de um voo de duas horas entre Londres e Barcelona feito pela Ryanair para maio. Os preços foram pesquisados pela CNN em março.

De acordo com Maurício Sana, a enorme diferença passa pelos altos impostos cobrados dos voos internacionais aqui na região e pela já bastante consolidada integração entre as fronteiras europeias e que ainda está longe de acontecer na América do Sul.

“Uma passagem de Buenos Aires para o Rio custa mais que o dobro do que uma para Bariloche, sendo distâncias comparáveis”, conta, “mas metade do valor são impostos, por ser um voo internacional”.

Os impostos sobre voos internacionais na América do Sul chegam a 120% do valor da passagem, de acordo com o executivo – e não é um problema de um ou outro país.

“Todos os governos tinham que sentar e discutir as condições, assim como fazem com os acordos econômicos”, diz ele.

4 aviões devolvidos e 1 parado

Sobreviver ao choque da pandemia, no começo de 2020, quando a companhia, que fez seu voo inaugural em 28 de janeiro de 2018, mal tinha completado o segundo ano de vida, exigiu da Flybondi um malabarismo impensável.

A primeira coisa, ainda em março, foi convencer os empregados de uma redução nos salários. A segunda, devolver cinco dos quatro aviões que já tinha, alugados sob contratos de seis anos que não estavam nem no meio ainda.

A luta pela sobrevivência também incluiu renegociar as dívidas e compras já encomendas de coisas que não tinham ideia de quando iam precisar novamente – de combustível a batatinhas, refrigerantes e uniformes.

“Tínhamos uniformes de inverno para receber, mas nem sabíamos se íamos poder voar no inverno”, conta o CEO.

O retorno

Promoções relâmpago, deixando os passageiros comprarem viagens sem data marcada foi o que ajudou a gerar algum caixa enquanto o esforço de contenção dos gastos fixos impediu dívidas ainda maiores do outro lado.

Uma indústria que despencou toda de uma vez também ajudou na tarefa.

A Flybondi voltou a voar com seu único avião, carregado de passageiros, em dezembro de 2020 – a companhia mantém a ocupação média dos assentos em 90% desde então.

Em março de 2021 já estava com três aviões; em agosto, com quatro e, em 2022, voltou aos cinco com que tudo começou.

Foi em julho de 2021 que a empresa conseguiu tapar o buraco financeiro aberto pela pandemia – “pagamos todas as dívidas negociadas com aqueles mais de 250 fornecedores”, diz Sana.

Em setembro, retomou o mesmo volume de passageiros que estava carregando ao fim de 2019, logo antes de a pandemia mudar tudo, e, também em 2021, conseguiu – pela primeira vez, no quarto ano de vida – fechar o ano no lucro.

Hoje, a Flybondi está com 12 aeronaves – “11 delas com melhores custos do que tínhamos em 2020”, de acordo com o executivo -, e já passou dos 300 mil passageiros transportados por mês, o dobro de 2019.

Em 2022, a companhia carregou 2,3 milhões de pessoas, número que é o quadruplo de 2021 e quase o dobro de 2019. Em 2023, Sana acredita que será possível dobrar esse número mais uma vez, e chegar aos 5,5 milhões de passageiros.

É, de toda maneira, um retrato bastante diferente de onde a companhia se imaginou estar em cinco anos quando abriu as portas, cinco anos atrás.

Fonte: CNN