17/04/2020 09h07
Foto: Divulgação
Ao longo dos séculos, as baleias têm sido vistas por uns como grandes e belos mamíferos marinhos que embelezam os oceanos com suas piruetas e até com seus sons característicos. Para outros, porém, têm sido consideradas apenas como importante fonte de proteínas ou, como antigamente, alvos para a extração de óleo que era usado para iluminação pública, lubrificantes e parte do cimento com o qual as grandes igrejas coloniais e edifícios públicos dos séculos 18 e 19 ainda permanecem em locais como Salvador.
Pela primeira vez, grupos de cientistas e economistas decidiram encarar o desafio de mensurar os benefícios que as baleias vivas proporcionam para o mundo e, após calcular os efeitos dos seus resíduos e de suas atividades e hábitos, inclusive alimentares, chegaram à conclusão que o total das "gordinhas" vivendo no planeta, hoje (estima-se em pouco mais de 1,3 milhão de indivíduos), teria um valor que atinge a casa de US$ 1 trilhão. Transportado para o Brasil, o valor das baleias que vivem ao longo do nosso litoral é de US$ 82 bilhões. Fica evidente, ante tais números, que perde totalmente a importância econômica do abate de baleias, atividade ainda hoje desenvolvida por alguns países, como o Japão.
A equipe que deu o pontapé inicial para tentar mudar a maneira como as baleias são vistas, quantificando o benefício que elas proporcionam ao mundo em dólares, foi liderada por Ralph Chami, diretor-assistente do Instituto de Desenvolvimento de Capacidade do Fundo Monetário Internacional (FMI). No Brasil, o trabalho foi desenvolvido pela equipe do Projeto Baleia Jubarte, em colaboração com a GWC, decidiu produzir uma estimativa de quanto valem atualmente as oito grandes espécies de baleias encontradas nas águas brasileiras.
Carbono e minérios
O maior benefício proporcionado pelas baleais está na área do meio ambiente, o que já é muito significativo quando o mundo já atravessa período de emergência climática. De acordo com o estudo do FMI, se fosse permitido que as baleias retornassem ao seu número pré-baleeiro de 4 a 5 milhões, isso poderia aumentar significativamente a quantidade de fitoplâncton nos oceanos. E, claro, o dióxido de carbono que capturam a cada ano. "No mínimo, mesmo um aumento de 1% na produtividade do fitoplâncton, graças à atividade das baleias, capturaria centenas de milhões de toneladas de CO2 a mais por ano. Equivaleria ao surgimento repentino de 2 bilhões de árvores maduras. Imagine o impacto sobre a vida útil média de uma baleia, mais de 60 anos."
Também foi constatado ser muito grande o efeito positivo causado pelos resíduos dos grandes animais, como diz o relatório do estudo: "Os resíduos dos enormes mamíferos (cocô e xixi) contêm exatamente as substâncias – principalmente ferro e nitrogênio – que o fitoplâncton precisa para crescer. As baleias trazem minerais para a superfície do oceano através de seu movimento vertical, chamado "bomba de baleia". Modelagem e estimativas preliminares indicam que essa atividade fertilizante aumenta significativamente o crescimento do fitoplâncton nas áreas que as baleias frequentam."
Quantificação no Brasil
De acordo com a equipe do Baleia Jubarte, para chegar à estimativa do valor de US$ 82 no cenário apenas nacional, primeiro estimou-se o número restante de grandes baleias do Brasil a partir de estudos e dados existentes sobre as ações de cada espécie na população global de baleias. Depois, calcularam os valores dos serviços produzidos pelas baleias com base nas mais recentes pesquisas científicas e econômicas. Como se espera que as populações de baleias retornem ao seu tamanho anterior à caça, os serviços devem crescer e atingir valores permanentes mais altos. Os valores das décadas de serviços produzidos pelas gerações atuais e futuras de baleias foram, então, convertidos em uma única soma que representa o valor, em dólares de hoje, das baleias vivas hoje.
Eduardo Camargo, do Projeto Baleia Jubarte, observa que o fato de os estudos realizados mostrarem que uma grande quantidade do valor está relacionada à contribuição das baleias para armazenar e sugar o carbono no oceano é importante para mudar até mesmo a forma como o Brasil vê seu papel no esforço global de restaurar o equilíbrio do oceano e mitigar as mudanças climáticas. E prossegue: "A recuperação das populações de baleias no Brasil ocorreu como resultado de políticas públicas de longo prazo desenvolvidas em colaboração entre a sociedade civil, sucessivos governos e outros países da região (o governo José Sarney foi responsável pelo fim da caça aos cetáceos no Brasil). Além de apresentar seus resultados, ambientais e econômicos, ao mundo, devemos poder extrair lições relevantes para enfrentar outros desafios relacionados ao clima no Brasil e em outros lugares."
Fonte: Mar sem Fim