15/09/2025 10h13
Foto: Agência do Brasil
O Banco Central do Brasil realiza, nesta semana, a 6ª reunião do ano do Comitê de Política Monetária (Copom), e o consenso entre analistas ouvidos pelo Correio é de que, apesar da deflação de agosto divulgada na semana passada, a taxa básica da economia (Selic) será mantida em 15% ao ano e seguirá nesse patamar até dezembro, devido às pressões inflacionárias persistentes e ao quadro fiscal que segue deteriorado.
Especialistas consideram o recuo de 0,11% no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto é pontual e, de certa forma, artificial, pois é resultado do bônus de Itaipu na conta das famílias brasileiras. Esse crédito neutralizou qualquer alta do indicador da inflação oficial, e, sem esse artifício contábil, o IPCA teria ficado positivo em 0,25%, próximo ao patamar de julho, de 0,26%, conforme cálculo de Fábio Romão, economista senior da 4Intelligence.
Os diretores do BC, que estarão reunidos nos próximos dias 16 e 17 no Copom, devem considerar que o ciclo de queda dos juros só deverá começar no primeiro trimestre do próximo ano e o ritmo do corte será gradual, na avaliação dos analistas. Como 2026 é ano eleitoral, o governo federal e os regionais devem manter os gastos elevados para continuarem no poder. Assim, para entregar a inflação no centro da meta, de 3%, o BC terá mais trabalho, e o presidente Gabriel Galípolo seguirá mantendo a mesma sinalização dura no combate à inflação do antecessor, Roberto Campos Neto.
A mediana das estimativas do mercado para a taxa Selic no fim de 2026, coletadas pelo BC no boletim Focus, está em 12,50% anuais. Analistas não descartam juro até maior por conta de estímulos fiscais que devem ser adotados na campanha eleitoral, pressionando a inflação.
De acordo com os analistas, o quadro fiscal vai determinar o ritmo do corte de juros pelo BC ao longo de 2026, pois a inflação continuará elevada. Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, por exemplo, acredita que os juros básicos devem começar a cair no início do ano que vem, mas eles devem encerrar dezembro entre 13% e 14% anuais, devido a esse cenário mais desafiador no próximo ano para o BC. "O fiscal vai ditar o ritmo de queda dos juros, mas sabemos que não haverá muita novidade, porque a expectativa de todo mundo é que o ajuste fiscal só vai ocorrer em 2027", afirma Vale.
O economista André Braz, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), também não vê espaço para o Copom reduzir a taxa Selic ainda, mesmo com a deflação em agosto, que é temporária. Para setembro, quando não haverá o desconto do bônus de Itaipu, Braz prevê os preços da energia subindo 10% e o IPCA encerrando mês com alta entre 0,3% e 0,4%. "Os movimentos de queda na inflação ainda são precoces. O momento ainda é de grande instabilidade e é preciso ver como essa inflação vai se comportar, pelo menos, até o fim do ano", alerta. Braz admite que, nos próximos meses, é provável que os preços dos alimentos voltem a subir, apesar da recente queda por conta do aumento da oferta doméstica de alguns produtos devido à suspensão de exportações para os Estados Unidos por conta do tarifaço.
Para os próximos meses, analistas reconhecem que há incertezas sobre o comportamento dos preços em função da perspectiva de novas medidas prometidas pelo presidente norte-americano Donald Trump após a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos de prisão determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da trama golpista.
No acumulado em 12 meses até agosto, o IPCA avançou 5,13% e segue acima do teto da meta, de 4,50%. A mediana das projeções do mercado para o indicador de carestia coletadas no boletim Focus, do Banco Central, está em 4,85%, para este ano.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, avalia que os dados do IPCA de agosto mostram que houve uma inflexão na inflação, mas o problema, agora, será a discussão sobre o ritmo da convergência para o centro da meta, de 3%. "Por conta disso, nem a estratégia nem a comunicação do BC devem mudar, e o Copom deve sinalizar a manutenção dos juros por um bom tempo", destaca. Ele prevê que a Selic continuará em 15% ao ano até março de 2026.
Riscos no radar
Especialistas alertam que há dados preocupantes do IPCA que devem estar no radar do BC. "A deflação do IPCA de agosto não pode ser considerada um número bom. "Mesmo o acumulado em 12 meses se aproximando de 5% será revertido em setembro, quando deverá voltar para níveis próximos de 5,30%. Ou seja, a deflação de agosto é enganosa e não muda em nada as nossas projeções de que o IPCA fechará 2025 em 5%", avalia Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Parners. A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, destaca que alguns dados do IPCA são preocupantes, como a persistência da pressão inflacionária em serviços. "O Banco Central deverá avaliar esse quadro. Apesar de alguns dados positivos no IPCA de agosto, a inflação continua acima da meta", alerta.
Pelas projeções da Tendências, a taxa Selic deverá começar a cair em janeiro e terminar o ano em 12,50% anuais. "Ainda assim será uma política monetária apertada, mesmo com a redução dos juros, e, por isso, o BC seguirá com o discurso duro para o combate à inflação", ressalta Ribeiro.?
Economista e professora do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), Juliana Inhasz também não vê espaço para o BC afrouxar a política monetária no momento atual, principalmente porque o quadro fiscal seguirá preocupante e deve determinar o ritmo de queda dos juros. "Nas entrelinhas dos comunicados, vemos que o Copom está fazendo a parte dele para tentar fazer a inflação convergir para a meta, mas o governo não faz a dele do lado fiscal", ressalta apontando a trajetória da dívida pública, que segue crescendo de forma expressiva.
No próximo ano, a dívida pública bruta deverá superar 80% do Produto Interno Bruto (PIB) pelas projeções do mercado. Inhasz atribui os juros elevados a esse quadro fiscal pouco animador e aponta problemas no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2026, enviado pelo governo ao Congresso no fim de agosto, como prevendo o cumprimento da meta de superavit primário de 0,25% do PIB. Para ela, a meta não é factível uma vez que as projeções do mercado indicam rombo fiscal até 2028. "O Ploa de 2026 é um show de horror, porque os gastos estão subestimados, com vários descontos de despesas, e as receitas continuam incertas", pontua. "O BC terá muita dificuldade para conseguir efeito na política monetária, porque continuará sozinho no controle da inflação e, por causa do quadro fiscal, a Selic continuará elevada", emenda.
Ao analisar o Ploa do próximo ano, o economista-chefe da ARX Investimentos, Gabriel Leal de Barros, estima que as receitas estão superestimadas em R$ 111 bilhões e, nas despesas, há vários gastos que não estão incluídos. "O Ploa está muito otimista e tem ajustes apenas pelo lado da receita", lamenta.
Superquarta divergente
A reunião do Copom, nesta semana, coincide com a do Fomc, comitê de política monetária do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), e, no segundo dia, a decisão será mais uma "superquarta" para o mercado financeiro. Ao contrário do BC brasileiro, o Fed deverá dar início início ao ciclo de corte de juros básicos, atualmente no intervalo de 4,25% a 4,50%.
A economista e professora do Insper Juliana Inhasz acredita que o BC brasileiro seguirá confortável para manter a taxa básica no atual patamar, mesmo com o Fed iniciando o aguardado ciclo de corte dos juros. "A decisão do BC seguirá sendo técnica, e, como os comunicados mostram alinhamento entre os integrantes do Copom, isso passa segurança maior de que as decisões acabam sendo unânimes", explica.
Danilo Passos, economista da gestora Wealth High Governance (WHG), avalia que, a curto prazo, a mudança na condução da política monetária do Fed não interfere na decisão do Copom a curto prazo. Ele também reconhece que o fiscal seguirá pensando na manutenção da taxa básica da economia (Selic) no atual patamar por um período "bastante prolongado" como tem sinalizado o Banco Central brasileiro.
"Desde o ano passado, quando o câmbio disparou, o mercado tem a percepção de piora no quadro fiscal e de que o governo está empurrando um resultado primário insuficiente para estabilizar a dívida pública. E o juro mais alto é determinante para normalizar essa situação. E, obviamente, em ano eleitoral, o quadro fiscal pode mudar", alerta. Segundo Passos, no caso de a inflação voltar a subir no próximo ano, será mais difícil para o Banco Central continuar cortando os juros, que não deverá ficar abaixo de 12% no próximo ano.
Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, destaca que o corte de juros nos Estados Unidos vai ajudar a política monetária de praticamente todos os países, inclusive, a do Brasil. "As expectativas de inflação acabaram caindo um pouquinho, refletindo essa queda esperada nos juros dos EUA, e isso ajuda a consolidar o cenário de que a alta da inflação no primeiro semestre estava mais ligada ao superaquecimento da economia e às incertezas", afirma. Contudo, ele reconhece que isso é apenas um lado da história e que o Banco Central ainda precisará reequilibrar a economia brasileira, uma vez que ainda há pressões de custos no mercado de trabalho e a demanda segue aquecida pela transferência de renda, que está relacionada aos estímulos fiscais.
"O Copom não tem pressa para começar a reduzir os juros. Então, muito provavelmente, manterá a Selic em 15% ao ano, e continuará sinalizando que os juros devem permanecer elevados por um tempo bastante prolongado", acrescenta. Megale aposta no início dos cortes dos juros no primeiro trimestre do ano que vem.
Fonte: Correio Braziliense