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Economia

Brasil tem 2 milhões de novos pobres só em janeiro

Ao todo, 13% da população do país estão sobrevivendo com uma renda per capita de apenas R$ 250 por mês

06/02/2021 10h40

Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

O fim do Auxílio Emergencial já levou 2 milhões de brasileiros para a pobreza apenas em janeiro. Ao todo, 13% da população do país, ou 26 milhões de pessoas, estão sobrevivendo com uma renda per capita de apenas R$ 250 por mês. O impacto do fim do benefício foi calculado pelo coordenador da Cátedra Ruth Cardoso no Insper, Naercio Menezes Filho.

Segundo o pesquisador, a quantidade de pobres hoje no Brasil já é maior do que a observada antes do início da pandemia de coronavírus. Em 2019, 12% da população era pobre, ou seja, cerca de 24 milhões de pessoas.

"Com o Auxílio Emergencial, o país conseguiu reduzir a pobreza, a extrema pobreza e a desigualdade de renda", afirma Naercio. "A pobreza só não cresceu mais agora porque uma parte das pessoas que estava em casa e recebeu o auxílio conseguiu arrumar emprego."

Durante o pagamento do benefício, a taxa de pobreza chegou a recuar para 8% da população, e a da extrema pobreza - brasileiros com renda per capita abaixo de R$ 150 ao mês - caiu de 3% para 1%. Foram os menores patamares já registrados pelo Brasil desde a década de 1970, quando as pesquisas domiciliares começaram a ser realizadas.

Essa melhora também se refletiu no índice de Gini, que monitora a desigualdade de renda em uma escala de 0 a 1 – quanto mais próximo de 1, maior é a desigualdade. O índice recuou de 0,53 para 0,47, caindo abaixo de 0,50 pela primeira vez na história brasileira.

A deterioração social que o país enfrenta hoje já era esperada. Todos os indicadores começaram a piorar já com a redução do benefício de R$ 600 para R$ 300.

"Com a diminuição do valor, a pobreza começou a aumentar. Em dezembro, ela já estava alcançando o mesmo nível de antes da pandemia", afirma Naercio.  Ao todo, o Auxílio Emergencial chegou a quase 68 milhões de brasileiros.

Uma conta difícil

Com o Brasil enfrentando uma severa crise fiscal desde 2014, manter o pagamento do Auxílio Emergencial passou a ser uma conta difícil de ser fechada pela equipe econômica. Nas últimas semanas, o debate pela volta do benefício ganhou força com a piora dos números da pandemia.

No ano passado, com todas as medidas adotadas pelo governo federal, a dívida bruta alcançou 89,3% do Produto Interno Bruto (PIB), uma alta de 15 pontos percentuais em relação a 2019.

O nível do endividamento brasileiro já é considerado elevado para um país em desenvolvimento. Na média, as economias similares à brasileira têm um patamar de dívida próximo a 65% do PIB. O tamanho da dívida bruta é um indicador bastante analisado por investidores e pelas agências de classificação de risco.

Na prática, portanto, uma nova rodada de gastos pode aumentar ainda mais relação entra a dívida e o PIB. Uma piora fiscal que pode se traduzir em fuga de investidores e, na ponta, provocar uma alta dos juros e da inflação.

Além do endividamento crescente, a equipe econômica tem o desafio de manter o teto de gastos, que limita o crescimento das despesas com base na inflação do ano anterior.

"Se o Brasil já tinha um desafio fiscal antes da pandemia, esse desafio aumentou brutalmente agora, nos próximos meses e nos próximos anos. O ideal seria conjugar as duas coisas (melhora fiscal e auxílio para os mais pobres)", afirma o analista de contas públicas da consultoria Tendências, Fabio Klein.

Estratégia do governo

Na última quinta-feira (4), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou, ao lado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que o auxílio pode voltar a ser concedido para metade dos beneficiários. A volta do benefício, porém, foi condicionada ao acionamento de "cláusulas necessárias".

A estratégia da equipe econômica é colocar uma espécie de cláusula de calamidade na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Pacto Federativo, enviada ao Senado em 2019, para permitir a suspensão temporária de regras fiscais e o aumento de gastos.

A cláusula de calamidade permitiria, por exemplo, a abertura de créditos extraordinários, os quais não se sujeitam à regra do teto de gastos.

A partir de 2022, o governo espera contar com o benefício integral da PEC do Pacto Federativo e das propostas Emergencial e dos Fundos para conseguir ter alguma folga no orçamento. “O mercado não vai gostar se vier um benefício social na forma do auxílio sem uma contrapartida”, alerta Klein.

Ajuste bilionário

Para estancar o endividamento do país, a missão da equipe econômica não é fácil. O governo teria de fazer um ajuste de R$ 84 bilhões até 2023 para impedir um novo crescimento da relação dívida/PIB, segundo uma simulação feita pelo sócio e economista da Kairós Capital, André Loes.

O exercício feito por Loes leva em conta uma série de hipóteses, como um crescimento do PIB de 3% este ano e 2% nos dois anos seguintes e uma taxa de juros que vai sair de 3% ao fim deste ano e chegará a 5% em 2023. Ele também estima que a regra do teto de gastos vai ser preservada e que o Tesouro receberá R$ 20 bilhões por ano do BNDES, além dos R$ 38 bilhões já computados em 2021.

"Nas nossas hipóteses, estamos considerando que o governo vai respeitar o teto de gastos. Então, o que se fizer pelo lado da despesa, tem de ser feito com algum avanço das medidas como as que estão previstas na PEC Emergencial", diz André. Na avaliação do economista, o esforço de R$ 84 bilhões é "factível", desde que haja um ajuste pelo lado das despesas.

Fonte: G1