20/08/2024 11h30
Foto: Lúcio Barbosa
O Terminal de Contêineres (Tecon) do Porto de Salvador registrou em julho a maior movimentação geral de contêineres da sua história (24 anos), com 43.750 TEUs (unidade de contêiner de 20 pés). O recorde anterior foi de 43.431 TEUs, em março deste ano. O volume gerado corresponde, ainda, a uma alta acima de 28%, em relação ao mesmo mês do ano passado. Nos sete primeiros meses do ano, o resultado geral deste dado. Entre maio e junho, o algodão vindo da região de Matopibapa, incluindo o Oeste baiano, teve grande destaque, com maior presença entre maio e julho, exportando 2.682% acima do mesmo período do ano passado. “Os números expressam o lugar de destaque que o terminal baiano tem no mercado, oferecendo logística 4.0, que agiliza todos os trâmites necessários ao embarque e desembarque e, também, a qualidade em infraestrutura, com cais e pátio equipados com maquinários com alta tecnologia e equipes treinadas para prover mais produtividade com total segurança”, detalha Demir Lourenço, diretor executivo do Tecon Salvador, unidade de negócio da Wilson Sons.
Demir Lourenço, é diretor executivo do Tecon Salvador e dos centros logísticos, unidades de negócios da Wilson Sons. Bacharel em Ciências Náuticas pela Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante - EFOMM, com pós-graduações em Gestão de Sistema da Informação (UFF), Gestão Empresarial (FGV), Gestão Estratégica de Pessoas (INSEAD), e Advanced Management Program - AMP na IESE Business School - University of Navarra, e Certificado Profissional em Transformação Digital - MIT Professional Education. Com mais de 35 anos de experiência na Wilson Sons, o executivo já atuou em diversos segmentos da companhia, considerada uma das maiores operadoras de logística portuária do mundo. Demir está à frente do Tecon Salvador desde o início das operações da unidade de negócios na capital baiana, em 2000.
A Baía de Todos os Santos, com o Porto de Salvador em destaque, começa a ser vista fora daqui como um potencial hub portuário brasileiro. Como você vê este movimento?
Olha, eu diria que estamos adquirindo um protagonismo neste processo todo. É algo que buscamos, perseguimos, e agora estamos conseguindo aproveitar. O mês de julho foi de realizações em um ano que tem sido muito bom. Está refletindo tudo o que a gente esperava e que sabíamos que poderia acontecer, uma vez que os investimentos fossem concluídos. Julho foi especial porque tivemos recordes gerais aqui no Tecon, com crescimentos significativos nas exportações, importações e cabotagem. O algodão teve um crescimento super expressivo. Agora, temos uma escala regular para a China do navio de 366 metros. Nós falamos muito do comprimento do navio, mas talvez as pessoas ainda não tenham noção do que estamos falando, são 15 mil contêineres, é muita coisa. Para você ter uma ideia, neste momento, eu tenho 9 mil contêineres armazenados. O navio pode carregar mais do que uma vez e meia o total de contêineres que eu tenho no pátio.
Como você explica esse desempenho tão positivo em julho? Este crescimento é uma tendência ou é algo como um cometa, que passa uma vez na vida?
Não foi um cometa e não é sorte. Isso é resultado de investimentos, de trabalho, da gente bater nas portas dos armadores para apresentar projetos, tentando convencer eles a utilizarem Salvador como um hub para o navio no Nordeste. Até o mês passado, não tínhamos nenhuma escala regular para o extremo oriente em nenhum porto ao norte do Rio de Janeiro. Todas as cargas que eram geradas acima do Rio tinham que ser transbordadas em algum lugar. As alternativas eram passar pela Europa, Caribe, ou descer para o Porto de Santos. Como esta escala regular veio para cá? Nós identificamos alguns serviços marítimos importantes que faziam a ligação entre o extremo oriente e o Caribe que traziam cargas para nós, mas que também levavam muitas cargas para o Porto de Manaus. Navios grandes iam até o Caribe, descarregavam em Manaus e o armador tinha um serviço para descer com ela até Manaus. Três empresas faziam esta operação e nós batemos na porta de todas as três para mostrar que era interessante para o navio de grande porte que ia até o Caribe vir para cá. Ela não retornava pelo Canal do Panamá, ia pelo Mediterrâneo e Canal de Suez. Convencemos eles de que vale a pena vir até aqui, mas antes batemos em muitas portas dizendo, ‘por que não fazer uma escala em Salvador e deixar que daqui vocês embarcam nos seus navios de cabotagem até Manaus?’. Há três anos que trabalhamos com isto e agora tivemos o primeiro fruto. Eu preciso falar também do orgulho que eu sinto por nossa equipe, que cresceu bastante recentemente. Vejo o brilho nos olhos deles buscando superar todos os obstáculos.
O que isto significa para a Bahia?
É uma ótima notícia para a Bahia. Tem muitas cargas distantes do porto, o algodão é a mais destacada, mas tem carne congelada e várias outras que desciam para ser movimentadas por Santos e que agora têm a opção de ser movimentadas por aqui. Os produtores estão eufóricos, interagindo demais com os armadores, e não estou falando apenas de baianos, têm gente de todo o Matopiba demonstrando interesse. Tem mercado de uva e manga na China. Com um tempo de viagem de 35 dias, há possibilidade de essas frutas chegarem em condições de ser comercializadas. Estamos falando de movimentações que já existem, mas tem muita coisa que vai ser viabilizada a partir desta linha direta. Abre-se um imenso horizonte. Tem um mundo de possibilidades aí com o início deste serviço regular. E não posso deixar de ressaltar que para nós é uma honra ter o primeiro serviço regular com navios de 15 mil contêineres escalando no Brasil e tendo feito a primeira escala em Salvador.
O navio não estava completamente carregado.
Não estar completamente carregado é uma coisa ótima para a gente porque nos dá a oportunidade de ampliar a movimentação. O navio tem espaço e isto é uma coisa preciosa na navegação. Está havendo falta de espaço nos navios, os fretes subiram novamente por conta disso. Então, termos um serviço regular direto para o extremo oriente em navios com bastante espaço para ocupar é uma grande oportunidade. Eles levam muita carga de importação da China para o Caribe, parte também é descarregada para Manaus, mas ainda tem bastante espaço para embarcarmos cargas brasileiras. Essa é a grande oportunidade que temos no país, em especial aqui em Salvador, temos espaço e um tempo de viagem bastante competitivo. Salvador tem uma condição de profundidade, com águas abrigadas, que nos permitem atracar durante o dia, ou noite, a qualquer momento, sem interferir na rotina do porto. Se você chega em Santos, ou Paranaguá, a entrada e saída de uma embarcação como esta é um evento. Em Santos, o canal é interditado, o ferry-boat que liga Santos ao Guarujá para e as manobras só podem acontecer durante o dia. Temos uma vantagem competitiva que é muito grande.
Como vocês trabalham para se descolar do momento desafiador que a atividade portuária enfrenta no mundo?
Fazendo uma análise macro, tem duas coisas que ainda impactam bastante o cenário global. Uma delas é a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, mas tem o conflito mais recente, no Oriente Média, entre o Hamas e Israel, impactando o fluxo no Mar Vermelho e praticamente bloquearam o acesso no Canal de Suez. Isso aumentou o tempo de viagens porque os navios que passavam por lá precisam ir pela África do Sul, aumentando os tempos de viagens. Na hora que isto aconteceu, as capacidades ociosas existentes foram ocupadas e elevou os custos de frete. Tem muitos locais em que o índice de utilização das capacidades está próximo de 100%. Este é o cenário que os exportadores e importadores estão vivendo. Tem ainda outras repercussões, porque o fato de o sistema rodar mais lentamente exige mais capacidade em todas as pontas.
Quais são os gargalos que o Porto de Salvador ainda precisa superar?
A médio e longo prazos, eu diria que o maior desafio é o de aumentar a retroárea. Nós precisamos de uma bacia de evolução mais profunda, e isto é algo que já está na agenda da Codeba (Companhia das Docas do Estado da Bahia). Com isso, os navios de 15 mil contêineres poderão entrar aqui totalmente carregados. O projeto da Codeba é muito bom, de ampliar o calado para 17,5 metros, e nos dará uma enorme tranquilidade de operação.
Publicado no Jornal Correio
https://www.correio24horas.com.br/agenda-bahia/eu-diria-que-a-palavra-e-protagonismo-avalia-diretor-do-tecon-0824