01/12/2024 11h25
Foto: APM Terminals - Divulgação
O setor portuário é extremamente dinâmico e exige planejamento complexo de longo prazo. De um lado, são necessários investimentos bilionários para implementar novas infraestruturas. De outro, a indústria naval – sujeita a crises periódicas e ajustes constantes – demanda alta flexibilidade e respostas rápidas para permanecer resiliente, garantindo que não haja interrupções nas cadeias logísticas de importadores e exportadores. Nesse cenário – onde é necessário planejamento para coordenar com eficiência diferentes demandas – a A&M Infra, a Navarro Prado Advogados e a APM Terminals apresentam o inovador estudo técnico Contribuições para o Planejamento da Consolidação de Hub Ports no Brasil.
O estudo avalia como o perfil da indústria de transporte de contêineres, a alta competição de mercado e outros fatores levam os armadores a buscar iniciativas para se diferenciar em meio à competição acirrada. Um dos principais motivadores é a busca por economias de escala, que depende de grandes navios capazes de transportar maiores quantidades de carga – um fenômeno que tem sido prevalente desde a introdução dos contêineres de transporte.
A classe de navios de 366 m de comprimento opera há anos em rotas fixas visitando portos internacionais. No Brasil, no entanto, é motivo de comemoração e muita preparação para receber essas embarcações. O estudo aponta que – historicamente falando – novas classes de navios geralmente começam a escalar a costa brasileira apenas 8 a 15 anos após começarem a operar em portos europeus. Para os navios de 366 m – que operam em Roterdã desde 2006 – essa defasagem cresceu, principalmente devido à falta de infraestrutura no Brasil para acomodar tais embarcações. Se a infraestrutura adequada estivesse disponível, esses navios poderiam teoricamente estar atracando em portos brasileiros desde 2018.
No cenário global, para que os mega-navios operem com altos níveis de ocupação e tempos reduzidos de carga e descarga, as paradas são limitadas a determinados portos (hubs), que concentram volumes de transbordo destinados a portos menores. Esses portos menores, por sua vez, são atendidos por navios menores: um sistema de distribuição de cargas conhecido como hub-and-spoke. Essa tendência global no setor otimiza a logística como um todo. Apesar disso, devido a questões estruturais nos portos nacionais, o Brasil está atrasado e ainda se beneficia de tal estrutura.
O estudo também traz estimativas de quanto um hub port poderia impactar positivamente os custos e a competitividade do comércio exterior brasileiro e da economia regional. O uso de navios de grande porte em um modelo hub-and-spoke em um serviço típico ligando a ECSA (Costa Leste da América do Sul) à Ásia, por exemplo, poderia reduzir os custos de transporte marítimo em cerca de 13%. Como exemplo prático, se tal solução fosse adotada para os principais serviços dessa rota (conforme o cenário “ousado” definido no Capítulo 2 do white paper), a economia total poderia ser de cerca de R$ 600 milhões por ano até 2030. Esse valor não considera o efeito análogo para outras rotas comerciais, para as quais as reduções de custos ainda não foram quantificadas.
Esse modelo também poderia trazer ganhos operacionais significativos. A operação de um hub eficiente – em estreita coordenação com os serviços de navegação – permitiria a redução dos tempos de layover (tempos de conexão de um contêiner entre o navio de longo curso e o navio de cabotagem), que hoje são de 5 a 7 dias nos portos brasileiros, mantendo tempos de trânsito competitivos para as cargas.
Além disso, um sistema hub-and-spoke poderia minimizar o número de paradas para os principais serviços de longa distância (internacionais), reduzindo o risco de atrasos e o impacto de quaisquer contratempos que possam se propagar em paradas subsequentes, aumentando a resiliência da cadeia. Além disso, ao conectar serviços alimentadores ao hub de forma mais eficiente, a conectividade de portos menores a uma gama mais ampla de linhas de navegação e portos de destino é expandida, fomentando mercados locais e regiões nas quais os portos estão localizados.
“A consolidação de um ou mais hub ports no Brasil significaria um aumento potencial de até 4,6 milhões de TEUs de transbordo (em volumes de 2023). Em comparação, o total de movimentações de transbordo realizadas no Brasil foi de aproximadamente 2,4 milhões de TEUs em 2023 – ou seja, em um cenário mais ambicioso para a implementação da dinâmica de hub ports, o volume de transbordo no Brasil poderia triplicar”, afirma Leonardo Levy, diretor de Investimentos da APM Terminals para as Américas. “Isso significaria elevar a incidência média de transbordo dos portos brasileiros dos atuais 18% para algo entre 30% e 40%”, completa o executivo.
Portos no Brasil com potencial para serem hubs
Segundo Marcos Pinto, sócio-diretor da consultoria A&M Infra, o Porto de Santos (SP) é um candidato natural e o principal favorito para se tornar um hub brasileiro. “Além de ser o maior porto da América Latina, respondendo por cerca de 40% da movimentação nacional de contêineres, é o único que recebe praticamente todas as linhas de longo curso (internacionais) que passam pela Costa Leste da América Latina”, afirma o executivo.
Segundo o estudo, além do Porto de Santos (SP) – favorecido pela proximidade com o maior centro de produção e consumo do país e pela diversidade de serviços de longo curso – outros portos que também podem se tornar hubs no Brasil incluem: Paranaguá (SC), Itapoá (SC), complexo Itajaí-Navegantes (SC), Suape (PE) e Pecém (CE). Estes são favorecidos devido a fatores como o posicionamento de players verticalmente integrados, a possibilidade de expansões significativas de capacidade e a facilidade de adaptação do acesso aquaviário.
Segundo Lucas Navarro Prado, sócio do Navarro Prado Advogados, o Planejamento Integrado de Transportes e outros instrumentos oficiais de planejamento setorial devem considerar seriamente a implementação de hub ports no país. “O Brasil tem potencial para desenvolver hubs regionais, e a adoção de soluções hub-and-spoke beneficiaria as cadeias de comércio exterior. Portanto, o planejamento oficial deve ter uma visão positiva sobre a questão – refletida em todos os seus instrumentos – buscando coordenar e gerar previsibilidade sobre as ações, ouvir a sociedade civil e dar maior segurança às decisões de investimento, com impacto favorável em termos de atratividade e mobilização de recursos.”
Um sistema de portos centrais: impactos positivos
A pesquisa também afirma que a adoção do sistema de Hub Ports impactaria positivamente diversos setores da logística e infraestrutura nacional:
“Por essas razões, uma vez atingido um volume crítico de contêineres, o desenvolvimento de um hub em qualquer porto do mundo é visto como uma oportunidade relevante e tratado como tal pelos formuladores de políticas públicas e pelos responsáveis pelo seu desenvolvimento. Isso não pode ser diferente no Brasil e, em grande medida, nosso arcabouço legal e regulatório já está preparado para permitir esse desenvolvimento”, avalia Marcos Pinto.
“É essencial que o planejamento público para o setor portuário e de transportes inclua a consolidação de hub ports no Brasil. O ambiente dos Portos Organizados deve ter flexibilidade e ferramentas adequadas para buscar o alinhamento de incentivos e cooperação com armadores/operadores para tornar possível a implementação bem-sucedida de um hub port”, conclui Lucas Navarro Prado.