Utilizamos cookies de terceiros para fins analíticos e para lhe mostrar publicidade personalizada com base num perfil elaborado a partir dos seus hábitos de navegação. Pode obter mais informação e configurar suas preferências AQUI.

Entrevista

Novo embaixador do Brasil nas Nações Unidas fala das prioridades

Ronaldo Costa Filho conversou com a ONU News

03/03/2020 21h21

A jornalista da ONU News, Monica Grayley, conversa com o novo embaixador do Brasil nas Nações Unidas, Ronaldo Costa Filho. O diplomata, que já atuou em Bruxelas, Genebra, Quito e Nova Iorque, explica as prioridades para 2020.

E o sr. volta depois de 25 anos para as Nações Unidas. Como está sendo esse retorno? Mudou muita coisa?

Olha, muita coisa mudou. E muita coisa continua igual. Isso que me espanta um pouco porque muitos debates ainda se arrastam e são lentos, os procedimentos são parecidos.  Agora, em compensação, a agenda se intensificou de uma maneira extraordinária. Há 25 anos, tínhamos um ritmo muito.

Um ritmo de trabalho, não é verdade? Em falando em ritmo de trabalho quais são as suas prioridades para este ano, Embaixador?

Olha, a prioridade é manter o foco do Brasil no multilateralismo. O empenho do Brasil em ver a ONU entregar nos ideais que acordamos há 75 anos. A impressão que nós temos no Brasil é que nos perdemos um pouco. As Nações Unidas criadas como um fórum essencialmente de cooperação e apoio mútuo entre os países, de troca de experiências, vejo, em muitas instâncias, se tornar um fórum de apontar o dedo um para o outro. Ressaltar o que se vê de deficiências nos outros países. Isso, acho que não é construtivo. Então, o que o Brasil gostaria de resgatar um pouco é esse princípio de que nós somos uma comunidade e temos que trabalhar juntos para achar soluções e não para ficar apontando defeitos. Sempre com respeito à soberania de cada país. Cada país tem um ritmo e uma realidade própria que tem que ser respeitada na busca dessas soluções para os problemas do mundo.  Um exemplo claro, te dou. Todo o debate no ano passado sobre a questão das queimadas da Amazônia. Nós nunca entendemos que a acusação fosse um caminho muito construtivo para achar soluções. O Brasil sempre se destacou na defesa do meio ambiente, no desenvolvimento sustentável, sediou a Conferência de 92, no Rio de Janeiro, as queimadas na Amazônia são um problema sazonal, que acontece em toda estação da seca. E entendemos que, naquele momento, a ênfase que se deu ao problema decorria de outros problemas que não justamente a preocupação com o meio ambiente. Então, é esse tipo de coisa: vamos sentar, trabalhar juntos, reconhecer que todos temos dificuldades, e que o mais construtivo é sentarmos, de uma forma positiva, para encontramos soluções que sirvam para todos.

Quando o sr. fala em trabalhar juntos. O Brasil tem trabalhado, tem cooperado, há várias décadas, com o G-4. O grupo formado por Brasil, Alemanha, Japão e Índia. E essa cooperação, ela visa uma ampliação do Conselho de Segurança. Embaixador, por que a reforma do Conselho tem se prologando dessa forma. Qual é a estratégia brasileira com os seus pares para levar à ação proposta?

O esforço do Brasil junto com o G-4 é um anseio que foi partilhado por muitos outros países. Não são só os quatro têm essa vontade. Responde à necessidade de que o Conselho de Segurança, um órgão tão central na estrutura das Nações Unidas, ao ter uma atuação destacada na manutenção da paz e segurança internacional, é um órgão que ao nosso ver não representa mais a realidade geopolítica do mundo e sim a uma realidade de 1945. O mundo mudou muito, a participação dos Estados-membros se ampliou de uma forma dramática. Na ONU, são hoje 193 membros e o nosso entendimento é que o Conselho tem que refletir a realidade do mundo de hoje para assegurar que as decisões aí tomadas. Se você for à Carta das Nações Unidas, as decisões aí tomadas são em nome de todos os Estados-membros das Nações Unidas. No nosso entender, para que seja justa ou que seja representativa, a participação dos Estados nas Nações Unidas, o órgão tem que ser também um pouco mais equilibrado em termos da representação dos Estados-membros.  Então há continentes que não tenha uma representação adequada.  A África, por exemplo é extremamente sub-representada.

Uma representação com assento permanente?

Mas a ampliação não é só como permanente, mas não-permanente para assegurar que todos têm a capacidade de participar e contribuir para a solução dos problemas de paz e segurança.

O senhor acha que esses impasses que acontecem no Conselho e algumas críticas atribuídas ao próprio Conselho em alguns temas se devem a essa falta de representação geográfica. O senhor acha que se houvesse uma representação maior o Conselho talvez tivesse avançado nesses temas?

É muito difícil você dizer que o simples fato de ser maior eliminaria os impasses e as dificuldades que o Conselho enfrenta. Eu acho que essas dificuldades vão se mostrar sempre presentes. Há visões diferentes entre os Estados-membros sobre qual é o caminho para se solucionar conflitos. O que nós dissemos é que a participação de membros de outros continentes que hoje não estão entre os permanentes assegurará uma pluralidade de vozes e uma discussão mais equilibrada de vozes do mundo inteiro ou do membership da organização na discussão de alguns problemas.