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Entrevista

‘Queremos muito uma reforma tributária’, diz presidente da ACB

Mário Dantas fala da expectativa com a economia brasileira e baiana, dentre outros assuntos

18/10/2022 21h00

Foto: Divulgação

Em 2019, quando Mário Dantas assumiu a presidência da Associação Comercial da Bahia (ACB), tinha o propósito de resgatar o prestígio daquela que com o passar do tempo vinha em declínio. Diversos eram os fatores, dentre eles a falta de recursos e a perda de centralidade, já que a sede fica no bairro do Comércio, em Salvador, e o eixo empresarial da Bahia se deslocou para a região da Avenida Tancredo Neves. Em entrevista exclusiva ao BAdeValor, Mário Dantas, que também é presidente do Grupo de Líderes Empresariais (Lide-BA), contou um pouco sobre sua atuação na ACB, a expectativa com a economia brasileira e baiana e os desafios encontrados na administração da instituição fundada em 1811 e que abriga todos os setores da economia como a agropecuária, indústria, serviços e comércio.

Como chegou à presidência  da ACB e como avalia a gestão?

A ACB foi a primeira entidade empresarial de todas as Américas, incluindo a Península Ibérica, e é mais antiga do que a entidade de Lisboa e a da cidade do Porto. Durante muito tempo o desenvolvimento empresarial no Brasil se confundiu com a Associação Comercial da Bahia, porque a Bahia era a capital do país, era o centro do Brasil. Só para dar uma ideia, o Polo Petroquímico de camaçari nasceu dentro da ACB.

Já vinha atuando como presidente do Lide-BA – o Grupo de Líderes Empresariais – já há alguns anos e aí um grupo de associados mais antigos da ACB nos convidaram para que montássemos um grupo novo de renovação da associação. Chamamos o Paulo Cavalcante, que é um advogado e empresário, tem o Ricardo Luzbel, empresário, tem Ana Coelho também empresária e dona da TV Aratu, Carlos Gantois, empresário que já passou pela Federação das Indústrias, Teobaldo, do Atakarejo, que tem história na associação supermercadista aqui na Bahia, e o Marcelo Nogueira Reis, que é um advogado tributarista e tem relevantes serviços prestados à ACB.

Montamos um time e estamos devolvendo um pouco do brilho da atuação empresarial da ACB muito focado nessa coisa de ser a grande casa do empresariado baiano. Então, a gente entendeu essa vocação em ser uma casa mãe e que dali nasceram todas as outras de representação empresarial e, por ela ser transversal, abraçar todos os setores da economia. A partir disso criamos um conselho das entidades empresariais e tem hoje 36 associados de vários setores que vão de combustíveis à bares e restaurantes.

Estamos muito focados em fazer a defesa dos temas relevantes. Temos o núcleo jurídico da ACB com advogados de primeira linha do estado e que se doam gratuitamente, já tendo atuado em algumas ações importantes de interesse do empresariado, inclusive no Supremo Tribunal Federal (STF) e temos feito o debate de temas extremamente relevantes para a sociedade.

Como a ACB contribuiu para a sociedade no período da pandemia?

Na pandemia, nós fomos a primeira entidade, o primeiro grupo da sociedade civil que partiu com o programa de doação de máscaras. Vínhamos estabelecendo um bom diálogo com o secretário de Saúde do município, na época Léo Prates,  o secretário de Saúde do Estado, Fábio Villas-Boas, e com o secretário de Planejamento, Walter Pinheiro.

Fomos pioneiros nessa campanha e quando a prefeitura proibiu a utilização dos transportes públicos sem a máscara, ela não tinha para distribuir, e a ACB foi para as estações realizar as distribuições, proporcionando para a população segurança e evitando a proliferação do vírus. Nós dissemos em nosso discurso de posse que não faríamos a crítica sem alternativa de solução. Sempre temos uma postura propositiva e proativa. Assim foi na pandemia.

Apesar de todas as ações que pensamos para a retomada das atividades, entendemos que as vidas humanas não eram recuperáveis e que o sacrifício que toda sociedade fez era necessário. Costumavam dizer que estávamos todos no mesmo barco, porém a verdade é que estávamos todos numa tempestade, cada um no seu barco, alguns bem estruturados, outros em pequenas canoas, alguns mais no centro da tempestade. Houve setores que foram até beneficiados, como o varejo e as lojas de material de construção, mas todos os outros fizeram um grande sacrifício e agora estamos numa retomada que parece sólida.

Faça um balanço de 2022.

Partindo do pressuposto de que alguns setores foram mais afetados e outros menos, temos uma recuperação absolutamente desigual. No ano de 2022, iniciou a correção da taxa de câmbio, o que favoreceu um pouco o real, mas ainda está subvalorizado. Isso beneficia muito setores exportadores, notadamente o agronegócio, e prejudica um pouco, sendo umas das principais causas a questão inflacionária que sofremos, os setores que tem seus preços cartelizados e balizados pela substituição da importação, os quais compram na mão de poucos produtores ou precisam importar.

Essa situação deu uma margem confortável para toda cadeia do petróleo, petroquímica, termoplástico que foi muito beneficiada pela taxa de câmbio. Toda a área de agronegócio (carne, frango, soja, milho, arroz, feijão etrigo) ou você exportava ou vendia no mercado interno, então como tinha sempre o balizador do quanto a pessoa estaria ganhando exportando, teve uma pressão inflacionária nos preços do mercado interno. Agora já conseguimos observar uma correção nesse rumo.

Vemos uma valorização do real em relação ao dólar e às principais moedas do mundo, principalmente ao euro que está sofrendo com a questão da crise energética por conta da guerra da Rússia e Ucrânia e, como fato inédito, pela primeira vez está valendo menos que o dólar. Essa apreciação do real diante dessas moedas tem ajudado inclusive a conter a inflação e temos um cenário de deflação nos últimos meses aqui no Brasil, o que vai ajudar a colocar a casa em ordem e prosseguir num rumo de crescimento orgânico e sustentável.

Qual a expectativa com o novo presidente do Brasil?

O cenário que nos deixa bastante tranquilos é que tivemos a eleição do Congresso com a característica bastante conservadora, de centro-direita bem acentuada. Então, independente do resultado do segundo turno, percebemos que teremos um equilíbrio que pode ser muito propício a realização de reformas estruturantes que o Brasil ainda precisa prosseguir.

Quais as principais reivindicações para o próximo presidente?

Sem dúvida a gente pede sempre uma desoneração, queremos muito uma reforma tributária que simplifique essa carga, principalmente o que é chamado de obrigações acessórias. As empresas têm um custo elevado para apurar e preparar as demonstrações obrigatórias de apuração de tributos, então acaba tendo gastos com mão de obra administrativa, contábil e fiscal para atender essas necessidades de formulários e preenchimentos. Sem dúvida precisamos de uma reforma que simplifique e reduza essa carga tributária do setor produtivo, mas que para isso se faz necessária uma reforma administrativa para diminuir o tamanho da conta que pagamos com impostos.

Essa reforma precisa ser ampla, envolvendo os três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Dos cerca de cinco mil munícipios, metade tem menos de 10 mil habitantes, e com praticamente zero de receita própria, que vivem absolutamente do repasse dos recursos constitucionais. Tem que pegar o que gasta hoje com o custo da administração daquela cidade e investir em melhores serviços para a população. O ótimo seria ter uma diminuição significativa do número de municípios, mas que não é possível ser feita de uma vez.

Um modelo interessante talvez seja algo parecido com que está sendo feito na reforma política no que diz respeito a cláusula de barreiras, em que os partidos que não atingirem determinadas metas passam a não ter mais direitos aos benefícios como a distribuição de fundos partidários, tempo de TV, todos aqueles direitos que os partidos tem para exercer a democracia e o exercício da atividade política.

Diminuir as câmaras de vereadores, prefeituras, toda a estrutura da máquina estatal nos três poderes será o ideal para a redução dos custos e o tamanho da conta dos impostos. E a reforma tributária que venha desonerar o setor produtivo e simplificar, porque além dos custos com tributos, temos também os gastos administrativos para gerar todas as informações desse sistema complexo que tem hoje no Brasil.

Como está a carga tributária no Brasil e como está impactando as empresas?

Temos uma das cargas tributárias mais altas do mundo. Essa carga é necessária para termos um equilíbrio fiscal. Não queremos um governo fraco e sem equilíbrio, porque isso promove a necessidade de alta de juros, o processo inflacionário. Defendemos a responsabilidade fiscal por parte do governo, mas para reduzir essa carga tributária precisa diminuir a conta ofertada, então é fundamental a reforma administrativa.

Quais são os entraves da economia da Bahia?

Eu acredito muito no modelo de desenvolvimento econômico voltado para as vocações. Temos como exemplo a República Dominicana, que era um país agrícola, com muitos canaviais e que muitos dos proprietários nem moravam lá, e que vivenciaram o desenvolvimento econômico fantástico com base no turismo. Lá não tinham voos porque não havia hotéis e o governo entrou incentivando e garantindo um número de assentos mínimos para as companhias aéreas para promoverem os voos.

Outros locais como a Costa da Riviera Maya que tem um desenvolvimento turístico maravilhoso e eu vejo aqui na Bahia essa vocação pouco explorada. Precisamos ter em nossa costa pelo menos quatro aeroportos alfandegários. Além de Salvador, um ao norte, que vai permitir um desenvolvimento da região do litoral norte sem precedentes, Ilhéus, já previsto, e um outro em Porto Seguro, que já é objeto de uma proposta de manifestação de interesse junto ao governo da Bahia e que tem um processo de elaboração de PPP em andamento.

Com esses aeroportos, teremos o desenvolvimento de toda a costa e aí pode ter uma malha de aviação regional que ligue o interior do estado, como a região da Chapada Diamantina. Temos uma diversidade religiosa, cultural, musical que permite a pessoa vir aqui e ir a mais de três destinos. O turismo é uma indústria totalmente justa que distribui renda na essência e é um setor que pode fortalecer toda a economia. Quando o turista vem, ele gasta com motorista de táxi, baiana de acarajé, restaurante, hotel, então tem a capacidade de multiplicação muito significativa.

Além disso, enxergamos o potencial da Bahia em crescer por adensamento e verticalização de cadeias. Nós temos uma produção de algodão muito forte no Oeste do estado, mas não temos uma tecelagem, então o material sai daqui para ser beneficiado no Sul ou Sudeste, assim como o trigo e a soja. Temos aqui florestas de manejo, mas sem indústrias moveleiras. Grandes produções de rocha que precisam ir, em sua grande maioria, para o Espírito Santo porque não tem uma zona de beneficiamento do granito e mármore baiano que são reconhecidos mundialmente. A política de desenvolvimento econômico tem que ser voltada para as vocações, quer seja por questões geoclimáticas ou por adensamento e verticalização de cadeias produtivas.

Nos últimos tempos a Bahia vem perdendo posição na economia da região Nordeste para Ceará e Pernambuco. Qual a sua perspectiva?

Temos que alinhar nossa atuação para que tenhamos as entidades empresariais aliadas ao governo estadual para que possamos fazer uma política de atração de novas empresas e projetos para a Bahia. Isso é fundamental. Esse alinhamento buscando atração com foco nas vocações é o que realmente pode fazer toda a diferença no sucesso da atração dos novos investimentos, fora alguns projetos mais estruturantes, como Pernambuco viveu com o Porto de Suape e com a nova refinaria de petróleo. Atrair também investimentos na área de infraestrutura que permita o abastecimento de matérias primas e o escoamento dos produtos acabados e a atuação com base nas vocações. Esse é o segredo para um bom desenvolvimento econômico no estado.

Quais são os seus projetos para 2023 na ACB e LIDE?

O nosso mandato concluirá em julho de 2023 e já estamos entregando a reforma do palácio da ACB no Comércio, mas o que mais me realizada foi ter feito o conselho das entidades empresariais que consolida a Associação Comercial da Bahia como a grande casa do empresário baiano.

Publicado no portal BAdeValor