Utilizamos cookies de terceiros para fins analíticos e para lhe mostrar publicidade personalizada com base num perfil elaborado a partir dos seus hábitos de navegação. Pode obter mais informação e configurar suas preferências AQUI.

Editorial

Recuperação econômica da América Latina deve demorar

A pandemia da Covid-19 provocou uma recessão que, devido a fatores específicos da região, exigirá mais tempo que o previsto para ser superada

28/05/2020 13h42

A divulgação dos dados do mais recente Indicador de Clima Econômico da América Latina, produzido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), mostra que todos os países da região terão tempos duros pela frente na área da economia, atingida fortemente pelos efeitos da pandemia da Covid-19. Não apenas pelo fato de o indicador ter registrado um índice negativo que é o pior dos últimos trinta anos, mas especialmente porque alguns fatores anotados pelos pesquisadores tendem a fazer com que a recuperação econômica, como instabilidade política, demanda insuficiente, corrupção e clima desfavorável para investimentos estrangeiros.

Os resultados, registrados no mês de abril, mostram que a pandemia levou a região direto para uma fase de recessão, o que já se havia percebido. O indicador passou de 14,1 pontos negativos para 60,4 pontos negativos entre janeiro e abril de 2020, numa brusca mudança do rumo, uma vez que, na pesquisa de janeiro de 2020, havia mostrado sinais de franca recuperação, na comparação com outubro de 2019, após um longo período negativado.

O índice de Situação Atual, que vinha se mantendo em patamar considerado desfavorável desde julho de 2012, também havia registrado uma ligeira melhora em janeiro de 2020, ao passar de 63,0 pontos negativos para 53,8 pontos negativos, mas a pandemia interrompeu o ensaio de melhora, fazendo com que atingisse 89,9 pontos negativos em abril, o pior resultado da série histórica iniciada em janeiro de 1989. O mesmo ocorreu com o Indicador de Expectativas, que vinha apresentando resultados positivos desde julho de 2016, que despencou para 23,1 pontos negativos.

Não que a situação de 2019 estivesse para merecer celebrações, mas o fato é que com exceção do Chile e do Equador, todos os demais países selecionados para a sondagem da América Latina tinham apresentado melhora do clima econômico, entre outubro de 2019 e janeiro de 2020, embora apenas Paraguai e Colômbia apresentavam índice positivo. Nesse mesmo período, o índice do Brasil passou de 25,0 pontos negativos para 2,0 pontos negativos, enquanto Peru e Uruguai mantiveram-se em níveis próximos aos do Brasil, com -1,8 e -2,8 pontos respectivamente.

Além dos problemas já citados acima, em todos os 11 países que integram o levantamento, a falta de inovação e a demanda insuficiente são consideradas questões relevantes, sendo que a primeira, de tão recorrente, já pode ser vista como um problema estrutural da região. A segunda retrata a situação atual associada aos efeitos da pandemia, já que, em outubro de 2019, esse problema tinha sido apontado como relevante por apenas quatro países.

Um outro problema na região é a corrupção, avaliada como relevante em nove países, não sendo citado somente no Chile e no Uruguai. Nove países também apontaram aumento na desigualdade de renda como um fator importante. Somente na Bolívia e no Paraguai este fator não foi avaliado como relevante. Igual número de países consideraram a falta de mão de obra qualificada como restrição ao crescimento, exceto Argentina e Uruguai.

 

Do levantamento destacam-se alguns fatores, como o fato de que realmente a pandemia reverteu a tendência de melhora que se desenhava no início do ano e os indicadores de clima econômico da América Latina sugerem a entrada da região em uma fase recessiva. Outro fator, e este tem mais a ver com o futuro e a necessidade urgente do processo de recuperação dos indicadores econômicos, tem a ver com a deterioração das expectativas, uma vez que, além da fase, tímida, da boa recuperação, o indicador de expectativa vinha melhorando e estava positivo, enquanto o da situação atual ainda era negativo, mas apresentando melhoras.

A questão da queda das expectativas é muito importante porque é resultante da avaliação negativa feita pelos investidores estrangeiros, uma vez que tem sido cada vez maior o número deles que revelam pouca vontade de aplicar seus recursos nos países latinoamericanos, citando como motivação para isto justamente fatores como a instabilidade política, níveis de corrupção e até a forma como cada governo tem se dedicado a combater a expansão do coronavírus.

Portanto, mesmo que haja a tentação de evitar o pessimismo, é preciso reconhecer que o quadro recessivo instalado pela Covid-19 irá exigir, para ser superado o mais rapidamente possível, além de sacrifícios, competência e responsabilidade da parte dos nossos governantes e muita paciência de nós, os cidadãos comuns.