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Artigo

Toque Jazz na Logística

Sérgio Maia

11/07/2021 06h13

Foto: Divulgação

O Jazz é um estilo de música moderna, de origem negro-americana, muito difundida após a guerra de 1914-1918, que segue um enredo; o Plot, porém, é muito caracterizado pela improvisação e envolvido pelas sonoridades e ritmos sincopados, não lineares, basicamente extraídos do ragtime e do blues.

Trazendo o Jazz para a Logística, temos as regras básicas em contratos, mas temos as improvisações, que precisam ser feitas; é a arte da Logística, além da ciência. Porque falo arte? Segue uma boa definição de Logística: Logística é uma ciência e arte que visa entregar os produtos no prazo e quantidade certos, com bons custos, com qualidade, evitando rupturas na cadeia de abastecimento e deixando o cliente satisfeito com os serviços prestados.

As improvisações conscientes, já demonstram um grau mais apurado de experiência do profissional logístico, onde por exemplo ele enxerga a importância de não mandar o caminhão para o cliente hoje, e sim amanhã, pois está chovendo e o OTIF será comprometido (Indicador-chave de Performance - medida do desempenho logístico ou de entrega dentro de uma cadeia de suprimentos).

Geralmente expresso em porcentagem, o OTIF mede se a cadeia de suprimentos conseguiu entregar: o produto esperado na quantidade e com a qualidade requerida pelo cliente, no local acordado e no horário esperado pelo ele.

Lembro-me de um caso prático: a Portaria de um grande CD (Centro de Distribuição) de cargas secas, que eu coordenava em outro estado, me avisou, às 03h da manhã, que um motorista de fornecedor, armado e totalmente descontrolado, queria forçar a porta para entrar no pátio do CD, regra proibida durante a madrugada.  O que fazer? Nos manuais e livros têm isso? Não tem... e você precisa ter habilidade para tratar o problema, com a rapidez que o caso requer.  De imediato, orientei à Portaria para chamar a Polícia, pois tratava-se de uma situação de risco, que não poderia ser solucionada sem a presença da autoridade policial.  

Outra vez tive um problema sério em um CD menor, onde a equipe Comercial fez muito mais pedidos do que o indicador de armazenamento demonstrava ter capacidade. Era perto do final de ano, época sazonal, na qual a área Comercial não quer perder vendas. Houve uma imensa fila de caminhões na porta do CD, que tinha espaço finito, uma série de aborrecimentos com os motoristas e trânsito no local. Neste caso, tive que comunicar aos motoristas o ocorrido enquanto negociava com o Comercial para esvaziar o CD -  fazer distribuições urgentes para lojas, aumentando o giro de estoques de forma a liberar espaço na central. Tudo isso com diálogo franco, mostrando meus passos para resolução da situação e feeling para evitar que os motoristas fossem onerados devido ao transtorno gerado.

Meus reports com reuniões presenciais, nesse tipo de problema, eram diários e, em geral, ocorriam sempre no início do expediente, muitas vezes tendo que convencer alguns motoristas bem exaltados, que chegavam a ameaçar   a equipe do CD, a aguardar a solução do problema em ordem e com tranquilidade.

Quando nos dedicamos a um compromisso, temos que enfrentar tudo que há na roseira: pétalas, flores e espinhos, sem perder o equilíbrio emocional, que é sempre muito importante.

O Jazz remete a importância das relações intangíveis, que não podemos perder nesse mundo digital. Para a tomada de decisão mais correta e com segurança só a experiência nos dá. Além disso, temos que ter o olhar do cliente e não, apenas, no cliente.

Olhar do cliente é ouvi-lo, entender o que ele está falando, mesmo que ainda não exista as condições ideais, por exemplo um CD que ele imagina e quer construir. Temos que enxergar os setores, a casa de máquinas, as docas, as instalações necessárias e equipamentos... entrar “nessa viagem” com o cliente.

Temos que ser também Hi Tech, mas não perder o lado Hi Touch, ou seja - perder a proximidade da equipe e do cliente, pois somos seres humanos. Não podemos ficar nessa de só cumprir processos, seguir normas e regras formais no virtual o tempo todo! Precisamos ter contato com os parceiros, clientes, fornecedores, motoristas, por isso é importante termos um novo modelo de negócios, já pensando agora, para o pós pandemia, sem camisa de força, bem natural. Temos que, em algumas vezes, improvisar ou inovar para que, no final, as notas do Jazz da Logística serem harmônicas e surpreenda o cliente.

Li uma frase a pouco tempo que achei engraçado, “não conheço nenhuma criança com 4 anos que queira ser Gerente de Logística”, risos... O pior é que verdade. Elas querem ser médicas, policiais, enfermeiros, bombeiros, ou seja: a Logística é um segmento importante, mas é uma profissão que está sendo moldada, na qual às pessoas (Administradores, Contadores, Engenheiros, Estatísticos, profissionais de TI) acabam sendo levadas a atuar em Logística por circunstâncias diversas que os conduzem a uma especialização e crescimento profissional para que sejam mais eficientes e eficazes.

Então não podemos esquecer de tocar Jazz na Logística, estudar, compartilhar conhecimento com colegas, fazer benchmark de operações. Precisamos ter coragem para improvisar, inovar e, afinal,  ser artistas da Logística, pois nem tudo pode ser tratado só com ciência, as coisas são mutáveis e o mundo é dinâmico. Quem imaginaria que Jeff Bezos iria sair do comando da Amazon por agora? Mas ele soube preparar um substituto ao longo de 27 anos de trabalho e nem por isso o mercado se agitou.

Logo, a criatividade, a sensibilidade e a improvisação/inovação muitas vezes dão o tom e o volume da nota na Logística que precisamos aplicar naquele momento.

Não, não quero que você pare de olhar a torre de controle, kpi´s, seguir regras e processos estabelecidos na sua logística, até porque Logística é planejamento, acompanhamento e organização, mas que tenha a sensibilidade de saber a hora de improvisar ou inovar, com base na sua experiência, para a tomada de decisões exitosas nesta área que é tão complexa e sensível.

No Brasil é tão difícil de explicar aos estrangeiros que a última milha pode ter até 300 km e com tantos desafios de infraestrutura, que somente quem está à frente sabe o que é passar por uma estrada de barro batido, no norte do Brasil, ou por uma ponte de madeira, que não sabe se vai aguentar o caminhão. Muito difícil, às vezes, ver que o motorista transporta mais papéis de notas, romaneios, cte´s, dentro da boleia do caminhão do que cargas na carroceria...

Toque e curta o seu Jazz, o seu jeito de fazer a Logística para ela nunca parar, nunca deixar de fluir com qualidade e nem gerar rupturas na cadeia.

Sérgio Maia - Consultor e profissional de Logística há 22 anos. [email protected]

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