Utilizamos cookies de terceiros para fins analíticos e para lhe mostrar publicidade personalizada com base num perfil elaborado a partir dos seus hábitos de navegação. Pode obter mais informação e configurar suas preferências AQUI.

Entrevista

Um novo olhar sobre as cidades inteligentes

A ideia do que é uma cidade inteligente ainda é bem controversa, diz o mestre e doutor Daniel Almeida Chagas

02/11/2022 11h00

Foto: Divulgação

Todos os dias surgem novos conceitos e critérios para definir as smart city (cidades inteligentes, em português). Contudo, uma ideia geral é clara: é preciso usar tecnologia para facilitar a vida do cidadão. Isso vale para o transporte, a mobilidade, a economia, a energia ou para qualquer serviço necessário à vida das pessoas. No entanto, esses setores podem mudar, pois atendem as necessidades específicas de cada local.

“Prefiro o conceito “cidade pensada”, uma cidade inteligente dar margem para dizermos que existem cidades que não são inteligentes, e a cidade é algo orgânico”, avalia o mestre e doutor em Informática Aplicada, coordenador e pesquisador do Laboratório de Pesquisa e Inovação em Cidades (Lapin) da Universidade de Fortaleza, instituição da Fundação Edson Queiroz, Daniel Almeida Chagas.

Com ampla experiência nas áreas de Interação Humano-Computador (IHC), robótica educacional, inovação de baixo custo, prototipação física, Internet das coisas (IoT) e user experience, o docente está na linha de frente criando soluções inovadoras para melhorar a qualidade de vida dos cearenses, por meio de projetos e parcerias firmadas no Lapin. Exemplos dos trabalhos desenvolvidos no laboratório são a criação colaborativa do capacete Elmo, equipamento de respiração não-invasivo que salvou milhares de vidas durante a pandemia da covid-19, e @Valie, sistema de coleta, armazenamento e visualização de avaliações de atendimento, baseado em totens interativos para facilitar a interação entre as prefeituras de Fortaleza e Sobral com a população das cidades.

À Entrevista Nota 10, Daniel Almeida Chagas compartilha um pouco da sua trajetória como coordenador do Lapin e conta como o laboratório ajuda a melhorar a vida de quem mora nos municípios cearenses.

Confira na íntegra a seguir.

Como surgiu o Laboratório de Pesquisa e Inovação em Cidades (Lapin)?

O Lapin foi minha entrada na Universidade de Fortaleza, e nasceu com a perspectiva de trabalhar prototipação, uma vez que entendemos que tirar ideias do papel é um ponto importante tanto para pesquisas quanto para projetos de empresas ou de governos. Então, surgiu na perspectiva de ser um “fab lab”(laboratório de fabricação do inglês fabrication laboratory), um local de prototipação e fabricação. A temática cidades entra para dar um foco no laboratório, enquanto área extremamente abrangente, já que em cidades estamos falando sobre trânsito, saúde, informação e pessoas. Dessa forma, acaba sendo, apesar de focado, uma área bem abrangente.

Segundo a empresa de consultoria e pesquisa tecnológica Technavio, o mercado de cidades inteligentes deve gerar US$ 2,1 trilhões até 2024. Quais são as características de uma cidade inteligente e de que forma esse conceito está presente no nosso dia a dia?

A ideia do que é uma cidade inteligente ainda é bem controversa. Existem várias definições, eu, particularmente, prefiro o conceito “cidade pensada”, uma cidade inteligente dar margem para dizermos que existem cidades que não são inteligentes, e a cidade é algo orgânico. Então, uma cidade pensada é uma cidade que se conhece, que tem mecanismos para coletar informações sobre ela própria, coletar informações dos seus cidadãos, coletar informações sobre esse ambiente, não somente por sensores e mecanismos digitais, mas, sobretudo, por meio de mecanismos concretos que a cidade se conheça.

E quem é a cidade? A cidade não é o espaço, a cidade são os gestores, a cidade são os cidadãos. No momento em que uma cidade tem esses mecanismos de coleta de informações e repasse essas informações para a própria cidade, temos uma cidade pensada. Ou seja, uma cidade em que os cidadãos e o governo compartilham de oportunidades para empreender ou aproveitar um espaço público como uma praça, coisas desse tipo.

Um dos trabalhos que estão sob sua coordenação no Laboratório de Pesquisa e Inovação em Cidades é o @Valie, projeto firmado em parceria com as prefeituras de Sobral e de Fortaleza, que visa aproximar a população da gestão. Como funciona esse projeto?

O projeto @Valie foi uma iniciativa do Lapin para apoiar as prefeituras de Fortaleza e de Sobral na coleta e disseminação de informações sobre atendimentos e serviços públicos. O projeto nasce com a proposta de desenvolvimento de totens de autoavaliação ligados a dashboard, distribuídos diretamente para as prefeituras e para as administrações dos postos de saúde para que o cidadão tenha um link direto entre ele, usuário de serviço público, e a gestão superior. Em Fortaleza, inicialmente, atendeu a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), nos postos de saúde, mas tivemos uma excelente atuação também na Secretaria Municipal do Turismo (Setfor) e na Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinf) com avaliação de obras de mobilidade urbana. Em Sobral, a atuação foi ligada a todas as secretarias. Todas as secretarias municipais poderiam requisitar um totem pelo setor de ouvidoria, que era responsável por avaliar e coletar essas informações e, posteriormente, gerar um dashboard de dados para o prefeito.

A mobilidade urbana e o transporte são critérios que definem uma cidade inteligente. Fortaleza, por exemplo, se destaca no acesso aos serviços públicos, sobretudo no que diz respeito a malha cicloviária. Como o sr. avalia Fortaleza nesses parâmetros e o que pode ser feito para avançarmos?

Fortaleza, de fato, se destaca por sua malha cicloviária, motivo de muito orgulho para quem compreende que esses novos modais são o que realmente diminuem a questão de tráfego e de trânsito. No entanto, ainda há muito a se fazer. O Lapin, por exemplo, participa do Observatório de Segurança Viária de Fortaleza, formado por um conjunto de entidades, incluindo a Unifor, representada pelo Lapin, coordenado pela Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC), visando apoiar a AMC e os vários órgãos que estão no comitê a melhorar a segurança viária. Nosso foco são os pedestres, os ciclistas e os motociclistas que, hoje, no trânsito da cidade são personagens que necessitam de uma atenção especial dado os números de ocorrências. Dessa forma, o laboratório se propõe a estar junto do Observatório desenvolvendo protótipos, artefatos, projetos de estudo para podermos melhorar a segurança viária de Fortaleza.

De que forma projetos e pesquisas desenvolvidas na Unifor têm contribuído para o avanço das discussões sobre cidades inteligentes que usam a tecnologia para melhorar a vida dos cidadãos?

O papel da Universidade e do Lapin nessa discussão sobre a cidade inteligente já é muito reconhecido pelos nossos pares, pelas prefeituras das cidades, assim como pelo Governo do Estado do Ceará, que já reconhecem que a Unifor tem papel fundamental nessa busca por melhorias, pela busca de uma cidade inteligente. Prova disto é que as secretarias desses órgãos já buscam a Universidade para o desenvolvimento de soluções inovadoras. Por isso imaginamos que o caminho é cada vez mais ampliar a atuação do Parque Tecnológico da Unifor (TEC Unifor) e do Lapin para apoiar esse ecossistema.

Nos nossos planos de atuação para 2023 até 2027 está previsto que o laboratório se posicione perante a cidade como esse ambiente de desenvolvimento de ideias e propriedades intelectuais com visão de sustentabilidade dentro, claro, dessa temática de cidade. Nosso foco não serão só governos, mas também empresas e startups que querem trabalhar com a temática cidade. Nós temos aí um universo de possibilidades de geração de negócios com potencial para serem absorvidos pelos governos, e que possam apoiar o empreendedorismo local.

O Lapin faz isso enquanto se torna palco de atuação dos seus alunos. A ideia é que os estudantes participem de projetos e que possam desenvolver as próprias capacidades e competências adquiridas no segmento do ensino para poderem completar os três segmentos que compõe a Universidade: ensino, pesquisa e extensão. Ou seja, possam fazer pesquisa de projetos e atuam na cidade, no caso da extensão.

Fonte: g1