Utilizamos cookies de terceiros para fins analíticos e para lhe mostrar publicidade personalizada com base num perfil elaborado a partir dos seus hábitos de navegação. Pode obter mais informação e configurar suas preferências AQUI.

Entrevista

Via Bahia planeja investir R$ 8 bilhões nas BR 324 e 116

José Pedro Guerreiro Bartolomeu fala sobre os planos da empresa para a concessão rodoviária

30/09/2021 19h00

Foto: André Frutuoso

A concessionária Via Bahia calcula que existam aproximadamente R$ 8 bilhões em investimentos represados para os 680 quilômetros de rodovias administrados por ela. Desde que assumiu a responsabilidade por administrar o trecho da BR-324 entre Salvador e Feira e da BR-116 de Feira até a divisa com Minas Gerais, a empresa calcula ter investido R$ 2 bilhões em melhorias nas vias, o que corresponde a mais de 90% da previsão contratual. 

Questões de natureza econômica – como a crise na economia brasileira e o aumento na matéria-prima para a fabricação do asfalto – somadas à necessidade de revisões contratuais periódicas que são previstas no acordo com o Governo Federal, mas que estão em atraso, seriam a explicação para o cenário. 

Um exemplo disso é que até 2019, a concessionária estimava uma defasagem de 27% entre a movimentação prevista de veículos nas rodovias administradas por ela em relação ao que se esperava quando a concessão aconteceu. Após  a pandemia, este índice aumentou e já passa dos 28%, estima o presidente da Via Bahia José Pedro Guerreiro Bartolomeu. Segundo ele, com a readequação contratual e a viabilização dos investimentos na construção da terceira faixa da BR-324, na duplicação de 430 Km da BR-116, além de outras melhorias necessárias, a estimativa é da geração de 10 mil empregos diretos e indiretos na Bahia e de uma movimentação econômica de R$ 24 bilhões. 

Hoje, a operação é responsável por 1,4 mil empregos diretos e indiretos, 15 postos de atendimento, sete praças de pedágio que lhe rendem uma arrecadação anual em torno de R$ 300 milhões. Além de ter uma participação significativa na arrecadação da maior parte dos 27 municípios cortados pelas vias administradas por ela. “Tem municípios em que 80% do ISS (Impostos sobre Serviços) são pagos pela Via Bahia”, ressalta Bartolomeu. 

Atualmente a Via Bahia e o Governo Federal, através da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), discutem a situação da concessão através de uma arbitragem. Para Bartolomeu, um acordo é o melhor cenário para todos os envolvidos. 

Qual é a situação atual da Via Bahia?

A Via Bahia nasceu de uma concessão que aconteceu em 2008, cujo contrato foi assinado em 2009. Não fomos nós (a Roadis Participações, atual proprietária da empresa) quem vencemos a licitação. Era um contrato da Isolux, Engevix e Encalso e infelizmente os controladores antigos começaram a falhar no cumprimento de obrigações contratuais, com atrasos na execução de obras, tanto que em 2015 houve uma confrontação do Governo Federal, inclusive sinalizando com a possibilidade de decretar a caducidade do contrato. Foi quando o atual acionista, a Roadis, assumiu, no final de 2015, com um acordo para entrar no negócio. Nossa entrada foi autorizada pela ANTT em 2016. É importante explicar que o nosso contrato de concessão é único. Em 2014, venceu a primeira revisão contratual e em 2019 temos o segundo marco. Essas revisões contratuais são os principais pontos de discordância que temos hoje em relação à ANTT. Essa é a base do desequilíbrio financeiro que estamos enfrentando.

A ideia da revisão é compatibilizar as necessidades da concessão com as demandas do sistema viário e com o cenário econômico. Esta cláusula surgiu a pedido do TCU (Tribunal de Contas da União) em 2008 no lançamento do edital de licitação, como uma preocupação com a possibilidade das condições macroeconômicas se deteriorarem, aumentando os custos do empreendimento e causando desequilíbrio.  

Em que pé está a discussão?

Atualmente estamos em meio a um processo de arbitragem, estamos discutindo a possibilidade de uma duplicação condicionada. A Via Bahia realizou até hoje mais de R$ 2 bilhões em investimentos. Isso representa um pouco mais de 90% de todo o investimento previsto no contrato. O que estamos discutindo hoje é o reequilíbrio do contrato para fazermos os investimentos que precisam ser feitos. Para se ter uma ideia, estamos a falar de aproximadamente R$ 8 bilhões, que estão represados, o que inclui duplicações, retornos, equipamentos de segurança, passarelas, o acesso definitivo ao aeroporto de Vitória da Conquista e toda uma série de melhorias operacionais, que irão aumentar a fluidez e os níveis de segurança da mesma. Estes R$ 8 bilhões devem ter um impacto de R$ 24 bilhões na economia, a criação de 10 mil postos de trabalho.

Em 2008, o anúncio da concessão foi bastante comemorado aqui na Bahia. O que explica toda aquela expectativa ter se transformado em frustração para os usuários das rodovias?

Eu entendo a situação do usuário, até porque também sou usuário. Compreendo a frustração porque a rodovia hoje não tem, em alguns trechos, aquilo que está previsto contratualmente, fruto desse desequilíbrio. Estamos sendo forçados a fazer não os trabalhos de manutenção que gostaríamos, mas o que é possível em função da arrecadação. O que eu posso dizer é que todo o dinheiro arrecadado no pedágio da rodovia tem sido integralmente reinvestido, o que deixa claro o nosso compromisso com o projeto.

Não tem existido nenhuma retirada. Mas o compromisso do nosso acionista não se limita a isso, além disso, temos injetado dinheiro para a realização de obras – no início de outubro vamos entregar mais cinco passarelas, que são necessárias em termos de segurança viária.  Além do que arrecadamos, injetamos mais R$ 300 milhões.

Uma outra coisa que as pessoas talvez não saibam é que a empresa fica com apenas 35% do valor arrecadado. Do restante do valor, 10% são impostos e 55% vai para bancos.

O senhor diz que foram investidos R$ 2 bilhões, que representam 90% do previsto no contrato. Mas acrescenta que há uma demanda por mais R$ 8 bilhões. O contrato atende essa demanda?

Não. Se estivéssemos a falar de um investimento adicional de menor porte, nós arcaríamos com ele. O problema é que o impacto da crise econômica e o seu efeito no CAP (Cimento Asfáltico de Petróleo), que é vendido pela Petrobras, foi muito grande. Em alguns contratos, o Governo Federal já fez o reequilíbrio, levando em conta esse aumento de custo, mas no nosso caso ainda não. Temos a pandemia, que provocou uma diminuição no tráfego.  Até 2019, tínhamos uma diferença entre o tráfego previsto e o que realmente foi registrado de 27%. Quando a gente projeta até o final da concessão, temos um impacto superior a 28% de todo o tráfego previsto. Estamos falando de um impacto significativo que impede a execução das obras. Só com a crise econômica e com a covid, já temos um prejuízo acumulado de R$ 500 milhões.

O que o senhor destaca como investimentos importantes que já foram feitos?

Eu destaco os avanços na duplicação da BR-116, todas as melhorias operacionais, postos de atendimento ao usuário, sistemas de telemetria e tudo o que é ligado a segurança viária. Agora, não estamos satisfeitos com a qualidade percebida em relação a alguns trechos do nosso pavimento, que é algo importante demais para o usuário. Apesar de CNT (Confederação Nacional dos Transportes) avaliar no último estudo sobre a qualidade das nossas rodovias como 85% classificadas como estado de bom ou ótimo.

Qual é a importância da concessão para os municípios no entorno dela?

Estamos falando de 27 municípios. Alguns deles dependem bastante da operação, chegando a ter 80% do ISS arrecadado pago por nós. Com as obras que faltam ser feitas estimamos o pagamento de R$ 1 bilhão em ISS. Isso pode ser usado em educação e saúde nestes locais.

Quais são as obras mais importantes que ainda não foram feitas?

Nós temos a terceira faixa da BR-324 até o CIA-Aeroporto, têm dispositivos de retorno em Terra Nova, Amélia Rodrigues e Feira de Santana. Tem toda a ampliação do trevo de acesso a Candeias e tem os 430 Km de duplicação da BR-116 e estruturas de acesso e de retorno ao longo da 116.

A Roadis atua em diversos mercados além do Brasil. Como você avalia a estrutura regulatória do país?

Cada mercado tem a sua particularidade. O Brasil tem muitas oportunidades de investimento. Eu posso falar com propriedade a respeito da Via Bahia.

Temos um entendimento diferente da agência em relação ao alcance de cláusulas em nosso contrato e obviamente essa diferença gera insegurança jurídica. Eu não quero generalizar, estou falando exclusivamente sobre a Via Bahia, que é o ponto que nos toca.

O contrato de concessão é ruim?

Não há contratos ruins. Acredito que as mudanças no cenário podem fazer com que um contrato que funcionava antes deixe de funcionar. Não podemos esquecer que contratos de concessão e de infraestrutura são de muito longo prazo. No nosso caso, estamos falando de 25 anos, prorrogáveis por mais 25 anos.

Quando estamos falando de uma concessão de rodovia, ferrovia ou qualquer coisa na área de infraestrutura é preciso levar em conta que a realidade muda. Como ela muda, os contratos precisam se adaptar a isso.

Vocês estão no meio de um processo de arbitragem. Quais são os próximos passos e que tipos de soluções a arbitragem pode encaminhar?

Nossas expectativas são de que a arbitragem se prolongue até o final de 2023, mas claro que vários fatores podem influenciar no prazo, alongando ou encurtando. Ela está prevista em contrato e foi uma tentativa de resolver a situação com mais celeridade que nos tribunais.

Vocês trabalham com a possibilidade de o governo pedir a caducidade do contrato?

Nosso compromisso é com o projeto e por isso continuamos a buscar uma solução que permita resolver as questões para que possamos iniciar o quanto antes as obras necessárias para os usuários. De fato, quando pensamos numa lógica do interesse do usuário e do interesse público, a melhor solução para o contribuinte nós acreditamos que o melhor é o reequilíbrio do contrato.

Publicado no CORREIO