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Economia

Ameaça da inflação volta e aflige classe média

Primeiras vítimas foram os mais pobres; agora, o aumento de preços pegou em cheio quem ganha mais

24/12/2021 07h50

Foto: Divulgação

Sempre que o preço de uma mercadoria sobre 1%, as vendas caem 0,64%, de acordo com Fabio Bentes, economista sênior da Confederação Nacional do Comércio (CNC). “Esse é o grande efeito perverso da inflação: ela se alastra”, afirma ele. As pessoas sentem em várias escalas e tentam reduzir os gastos onde dá. No Conceição Discos, o tíquete médio, que era de R$ 80 antes da pandemia, agora é de R$ 60.

Há um consenso entre economistas no sentido de que, mesmo antes da pandemia, já havia uma pressão de preços no Brasil, provocada principalmente pelos gastos do governo.

Quando o coronavírus chegou e boa parte da economia mundial parou, a inflação se tornou um problema global.

A quebra nas cadeias de produção provocou um aumento de preços generalizado no planeta. Principalmente no preço dos combustíveis. Em 2021, o preço internacional do barril de petróleo subiu 60% – e bateu o maior valor desde 2014.

No Brasil, porém, como já tínhamos um cenário de aumento de preços – não tão agressivo, é bom dizer –, as coisas foram se encavalando.

“Foi uma tempestade perfeita”, diz André Braz. “Juntamos no mesmo caldeirão a crise hídrica (que aumenta o preço da energia elétrica), a quebra nas safras (também provocada pela falta de chuva), a desvalorização cambial (que vem da fuga de investimentos estrangeiros) – tudo isso com os já tradicionais problemas fiscais, agravados ainda mais pelo furo no teto de gastos anunciado pelo governo em outubro”, diz ele.

Com isso, chegamos a uma inflação de 10,74% acumulados nos últimos 12 meses até novembro, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial, o IPCA do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Perspectivas para 2022

“Nada do que causa a inflação está sendo resolvido”, diz Bentes, da CNC. “Então, a perspectiva não é boa.”

O único fator, segundo os economistas, que pode ser parcialmente revertido é a escassez hídrica. Com um fim de ano mais chuvoso, devemos – pelo menos momentaneamente – deixar a bandeira mais rigorosa da conta de luz. E isso pode aliviar um pouquinho a alta dos preços.

Nada, porém, que dure muito. Com o segundo ano seguido de La Niña, os serviços de meteorologia dizem que teremos chuva acima da média nas regiões Norte e Nordeste.

Mas a região Sul e os estados de São Paulo e de Mato Grosso do Sul receberão menos precipitação que o normal, com chance de algumas estiagens regionalizadas.

Sem atacar as causas

“Já tivemos a crise do apagão, no começo dos anos 2000 e resolvemos como? Com termoelétricas, que usam petróleo para produzir energia. Acabamos criando um duplo gatilho para a inflação naquele momento. Agora, poderíamos investir em energia eólica, em geração solar, mas nada disso está acontecendo”, diz Bentes.

“O Brasil tem a chance de transformar seus problemas em oportunidades”, diz Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP). O país, segundo ele, poderia atrair investimento estrangeiro para atuar nessa área de geração de energia limpa. Melhoraria dois problemas de uma tacada só: o da energia e o do câmbio – dois grandes gatilhos da inflação.

“Mesmo aumentando os juros, não estamos atraindo investimentos porque, para o investidor internacional, o Brasil não tem uma estratégia crível para promover crescimento econômico. E com medo do que pode acontecer, ninguém vem”, acrescenta Braz.

Ou seja, mesmo com auxílios econômicos para os mais pobres, as causas da inflação continuam. “E como no ano que vem ainda teremos inflação, que pressiona ainda mais o câmbio, as expectativas não são das melhores”, diz o economista da CNC.

Preços represados

Na indústria de peças que Klaus Hepp dirige, na sorveteria de Silmara ou no restaurante de Talitha, o que está segurando os preços é a diminuição do poder de compra dos clientes.

“Se tive um aumento de custos de 10% e consegui repassar 3% ou 4% para o cliente, posso me dar por feliz. Já é muito”, afirma Hepp.

Mas, se o real continua se desvalorizando, até quando esse represamento de reajustes vai durar? “Estamos cortando gastos, procurando mais eficiência por meio de softwares de gestão – tudo para não ter que repassar o aumento de custos na íntegra para o consumidor. Mas chega uma hora que se a pressão de preços continua, a criatividade acaba e não vamos ter outra saída”, afirma Marcelo Giovani Guimarães, diretor de planejamento industrial, da fábrica de calçados Usafllex. Ou seja, uma hora a corda arrebenta. Quando isso acontecer, teremos recessão.

Fonte: CNN