26/05/2023 06h05
Foto: Divulgação
O Senai Cimatec pertencente à estrutura organizacional da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) deu início à execução do programa BRAVE, primeira iniciativa do Senai Cimatec Sertão, que tenciona desenvolver tecnologias de produção industrial para exploração do semiárido da Bahia. Como sabemos o semiárido é um tipo de clima que apresenta longos períodos de estiagem, temperaturas elevadas, com chuvas mal distribuídas e raras. Cerca de 67% do território do Estado da Bahia tem esse clima, cobrindo uma área maior do que a do Estado de Ceará. Tal programa está sendo financiado pela Shell Brasil com recursos oriundos de exigência fixada na Lei do Petróleo (Lei 9478/97) que obriga as companhias petroleiras a aplicarem 1% do seu faturamento bruto em Pesquisa e Desenvolvimento e Inovação, constituindo-se numa das cobranças da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
No centro das atenções está o sisal (agave sisalana) planta xerófila que suporta secas prolongadas e temperaturas elevadas. O sisal é colhido durante todo o ano e suporta a aridez dos solos nordestinos e é a fibra natural mais dura que existe. O Brasil é considerado o maior produtor mundial de sisal e a Bahia é responsável por cerca de 80% da produção nacional. Grosso modo o sisal é composto de aproximadamente 5% de fibras, 15% de mucilagem e 80% de suco.
As folhas são desfibradas e transformadas em fios naturais quando a planta atinge três anos de vida, ou quando suas folhas atingem até cerca de 140 cm de comprimento que podem resultar em fibras de 90 a 120 cm. A vida útil da planta é de seis a sete anos e suas folhas são cortadas a cada seis meses. As sementes para uma nova planta brotam com o nascimento de uma inflorescência, a flecha do sisal. Logo após a planta morre. Atualmente o aproveitamento econômico do sisal se restringe à transformação industrial de suas fibras em cordas diversas, inclusive navais; fios torcidos, terminais e cordéis; tapetes decorativos; estofos; insumos de artesanato; pasta para indústria de celulose; sacarias; e placas de poliuretano.
O aproveitamento do sisal poderia avançar com o emprego do suco e da mucilagem em diversas aplicações. A mucilagem pode ser utilizada na alimentação animal in natura, fenada ou silada. O seu baixo teor proteico sugere seu uso como volumoso na formulação de rações, misturada a outros alimentos.
Se retirados os elementos que a torna toxico, é uma excelente ração para galinhas poedeiras, por exemplo, que necessitam de nutrientes com pouca proteína. Isso as impede de adquirir sobrepeso, tornando-as mais produtivas. O suco é rico em ecogenina, fármaco de onde se estrai corticosteroides. Também pode ser utilizado como bioinseticida, no controle de lagartas, de nematóides e carrapatos, como sabonete e pasta cicatrizante.
O momento sugere o resgate dos projetos da Cortex, que objetivava a produção de corticosteroides, e da CCB, que pretendia fabricar celulose, estudando a eliminação dos pontos fracos que levaram ao fracasso os dois projetos. O primeiro falhou devido a problemas logísticos e o segundo fracassou no marketing e na dimensão. Há de se estudar o projeto de uma planta industrial onde se extrairiam as fibras, mucilagem e suco num mesmo local, ao invés de se usar as portáteis máquinas de desfibramento levadas para os campos. Essas máquinas, conhecidas como paraibanas, são de baixa produtividade, exigem esforço humano gigantesco e a qualquer descuido do operador acidenta-o, ferindo ou mesmo decepando suas mãos e braços.
Pelo que se tem notícia o BRAVE incluiu em seus estudos a produção de etanol a partir dessa matéria-prima. Vale lembrar que existe um tipo de sisal, conhecido como agave tequileiro, bastante usado no México para fabricação de tequila. Além da produção do etanol em larga escala, miniusinas poderiam ser multiplicadas em pequenas instalações e produzir tequila de modo semelhante à da produção da nossa tradicional cachaça, que também usa alambiques pequenos.
Muitas outras culturas podem ser lavradas nas terras do sertão. A busca da convivência com a seca, tendo a natureza como aliada, é um caminho de melhor resultado do que o simples combate às secas. O BRAVE se apresenta com alternativa excelente para o desenvolvimento do sertão e com certeza terá apoio da força euclidiana dos seus habitantes.
Adary Oliveira é engenheiro químico e professor (Dr.) – [email protected]
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